Visitas da Dy

domingo, 10 de maio de 2015

Arma-Dura



Fez planos de papel. Desses que já nascem sabidos de seus destinos: o fim prematuro. A não realização. O canto da página. O esquecimento breve, apesar da euforia passageira.
Recortou a folha de papel como se fosse uma máscara e a colocou. Era quase uma arma-dura com a qual enfrentaria o mundo a partir daquele momento.
Tinha os passos exaustos de lutas encampadas quase em vão, daqueles dias em que tudo o que via era o concreto, também armado, em curvas, que feriam as retas paralelas dos tais planos rabiscados nos papeis.
Frente às vitrines espelhadas observava como a tal arma-dura lhe caia bem e já não sabia mais, ao longo dos dias atravancados pelos vaivens cotidianos, se a máscara lhe cobria o rosto ou se revelava quem ela era de fato.
Explicava-se a si mesma que a máscara seria a sua arma mais dura frente aos outros. Com ela manteria distâncias seguras, pouparia todo o desgaste do desconhecido. Mostraria-se forte o bastante para não terem penas de suas feridas e suficientemente preparada para aguentar todas as adversidades.
Avançava, ora acreditando na nova face, ora aceitando que sempre fora a mesma. Escorregando pelos cantos das ruas, passava em brancas nuvens, desejando deitar-se sob o azul do céu, sobre o verde da grama e perde-se nas chuvas multicoloridas de esperanças abandonadas.
Desligava-se, aos poucos, de quem era e fixava-se em seus reflexos. Esquecia-se que usava a arma-dura. Esquecia-se que convocara há tempos uma guarda fiel para si e que se escondia. Esquecia-se, aos poucos, das flores, dos bilhetes, das bolhas de sabão, das vontades de ficar.
Acreditava-se mais forte por conta da máscara, sem perceber que a força era dela desde o início e que só precisava de seus sorrisos para compor e recompor tudo o que estava por vir.
Depois de um banho de chuva, desses comuns no outono, desceram-lhe as gotas d’água e os pedaços da máscara, desfazendo sua armação. Despida de suas armas, de sua máscara, maquiagem bem feita, agora estava diante de si mesma e, percebeu que todas as pedras no caminho foram vencidas por ela mesma.

A máscara não era tão necessária. Desfez-se da fantasia e passou a encarar o mundo olho no olho, sem  correr, aceitando os desafios, como quem acorda para tudo o que virá.

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