Visitas da Dy

domingo, 31 de julho de 2016

Colheita





Tantos sonhos vivi...
Outros tantos estão por vir
E me inscrevem no mundo da fantasia,
Em terras distantes de onde meus pés estão.
Como chegarei, o que há de ser
Nem as estrelas sabem,
Mas há de se saber virar as páginas
Para o novo escrever.
Abandonar a escuridão
E mirar a lua:
Há, sob esse céu,
Muito mais do que se possa querer.
Há muito mais tapetes em que posso voar,
Muito mais sentimentos que posso transbordar,
Então, é preciso reconhecer
A hora da partida,
Do embarque,
Do desconhecido
E colher o que se dá.
Como fuga do cativeiro,
Liberdade é arriscar.
Todo o resto é medo.
Todo o resto é paralisia.
Todo o resto é o nada,
E para os céus que desejei,
Só o abismo me transportará.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Coração-Lobo





À guisa de qualquer criatividade, poderia se usar o adjetivo casmurro, como no clássico literário, sem que fossem cometidos crimes autorais ou absurdos comparativos.
Taciturno também poderia cair muito bem como carapuça ou luva naquele ser que perambulava sobre a terra sem maiores pretensões do que existir e, sem esforço algum, aborrecer este ou aquele passante que ousasse direcionar-lhe um sorriso.
Não era por mal que andava carrancudo ou cabisbaixo. Não era por mal nem que existia. De fato, não conhecia a maldade e nem a praticava. A quem lhe perguntasse, por cisma, o motivo do silêncio ou da opacidade, justificava-se apenas colocando a culpa no mundo que já não ia mito bem há tempos.
Quem o observava de longe era capaz de afirmar, de certo, que se tratava de apenas mais um homem fechado, desses que se cercam de seu egoísmo e já nem o espelho aceitam por companhia, por temer dividir-se em dois.
A ausência de vícios não lhe favorecia. O mau gosto pela vida nem era mais notado. E tamanha tristeza só conseguia ser maior que o velado desespero de um coração solitário como um lobo que teimava em habitar-lhe o peito.
Ainda tinha gosto pela poesia, mas já perdera o viço das rimas.
Ainda tinha gosto por quadros, mas as tintas eram desbotadas.
E seu pobre coração-lobo, uivava nas madrugadas longas e insones uma canção tão comprida e estridente que nem com o travesseiro era possível abafá-la.
Assemelhava-se com uma ostra fechada, mas parecia não ter nenhuma pérola a oferecer, senão, um sorriso muito branco, muito inexpressivo, muito lugar comum, que não refletia tampouco o que sentia.   
Talvez fosse, na verdade, um casulo em metamorfose, aguardando, ansioso, o momento do despertar. Aguardando a boca fresca de aurora a lhe chamar o nome e devolver a vida, roubada em uma das esquinas do tempo, quando os planos feitos foram jogados pelos ares e o chão desabara.
Talvez esperasse a leveza do vôo de cabelos soprados pelo vento que lhe acariciariam a pele e trariam à tona as esperanças enterradas nas sombras do esquecimento.
Talvez esperasse ouvir o seu nome cantado como o som de cotovia ao raiar do dia, mas já fazia ouvidos moucos a toda voz que a ele se dirigia.
Talvez vivesse de esperas e esquecera, de fato, que os passos precisam ser dados para existirem. Talvez tivesse se esquecido do que era a ação e, por isso, parecia ser tão estático.
Talvez tivesse esquecido o que era a alegria de ser amado e já não amava entregue aos medos que lhe cercavam e que acabaram por domina-lo.
Talvez esperasse que um anjo abrisse o céu e lhe estendesse a mão de luz para salvá-lo, mas ainda tinha os olhos fechados para qualquer luminosidade que se atrevesse.
Talvez tivesse aprendido a ser uma quase estátua. Um ser sem ser. E, a essa altura da vida, proteger-se debaixo de seu chapéu envolto a um sobretudo era tudo o que lhe havia sobrado.
Sobrava na vida. Não sabia mais como ser reintegrado, fadado ao seu silêncio e monotonia.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Era Amor





Era um amor (quase) igual a todos os outros. Desses que se pretendem infinitos. Que sonham com surpresas nas datas especiais, com valsas e vinhos.
Era um amor sonhado pra ser bem mais que bonito, beirando o absurdo da beleza, com toques sinceros de compreensão e de companheirismo, desses que mais parecem roteiros de filmes.
Era um amor esperado por tanto tempo que mais parecia uma vida inteira. E, à iminência de ser concretizado, tremeu o chão e fez-se, aos poucos, ruínas.
Era um amor digno de diário de menina, enfeites e poemas, mas foi perdendo aos poucos a rima, a métrica, a cadência que era preciso para existir, crescer, manter-se forte.
Era um amor para se apostar. Para jogar até a última ficha, sem maiores medos, na certeza de que perder-se era, sem dúvida, encontrar-se no outro. E isso trazia ares de felicidade.
Era um amor pra ter sido entre duas pessoas. Dessas que sabem bem onde tudo vai dar, onde os caminhos se cruzam e as histórias passam a ser apenas uma e os planos passam a ser divididos.
Era um amor que não quis vingar, como planta que recebe apenas água e enfraquece ou se cansa de viver e salta rumo ao chão, esquecendo-se de lançar sementes ou de brotar.
Era um amor que padeceu mínguas de atenção. Que tentou bravamente viver de gotas de afetos, mas cuja fome era maior do que apenas de ilusão e a boca não se enchia mais nem de admiração, nem de esperança.
Era um amor que mirrou. Que de queda fez-se em cacos, que dos cacos abriu-se em cortes e entre os (im)pulsos que lhe davam vida, afogou-se nas ausências e nas dores.
Era um amor que agonizou e encontrou sobrevida em versos. Que perdeu a cor, que tornou-se opaco e que, dos olhos apaixonados, fez verter lágrimas de desistência.
Era um amor que poderia ter acontecido, mas como alguns amores já conhecidos, são mais belos em formas de histórias, poemas, lembranças.

terça-feira, 26 de julho de 2016

Depois do Vinho I


segunda-feira, 25 de julho de 2016

Além da Curva





O que me espera atrás daquela curva? Quisera eu saber!
Por enquanto basta-me saber que tenho pernas e pés para construir o caminho.
Por ora tenho olhos atentos para a paisagem e ouvidos abertos para toda canção que o vento me sussurra.
E, depois de ter caminhado tantos desertos – os que me atravessam, os que invento e os que me foram destinados – tenho desejos de que ali, em algum lugar, haja um poço de água fresca. Ou um poço de sonhos: os que já realizei, meus alentos, e os que ainda acalento, minhas esperanças.
É possível que, virando aquela curva, encontre alguma sombra de frescor ou de medo. Esse medo que antecede o passo a ser dado. Esse medo que tempera o desconhecido e que ao mesmo tempo que parece freio é acelerador. Esse medo que precisa ser vencido e transformado em ação. E é aqui que me emprenho: no próximo passo.
E se há o próximo passo, haverá a próxima dúvida, a próxima pergunta e as próximas noites insones, a vagar pelas ideias e labirintos que eu mesma crio e que aumentam a distância entre meus pés e a curva que me espera. Haverá um atraso no caminho. Haverá um desvio, um atalho, uma pedra. Haverá a quase desistência. O conforto pelo lugar conhecido. O sossego de não ter que me mexer.
Mas há a curva e seus segredos. Há um mundo a ser descoberto e os passos que construirão o caminho e por mais bonita que seja a paisagem que componho, pintá-la ali atrás do que não vejo ainda há de ser a motivação maior. E sigo.
Experimento as ansiedades da curva à minha espera, mas não posso desviar o olhar do caminho que percorro. E aprendo, com esses detalhes, que a imersão é o melhor caminho. E não sou mais caminhante, mas parte integrante do que vejo, vivo e anseio.
Sou tanto o caminho que faço quanto a curva que me espera. Viver as paisagens é senti-las. É descrevê-las. É registrá-las em mim, assim como ela me registra, sob forma de pegadas, em cada passo da estrada.
Sou o todo em fragmentos. Sou junções. Sou verbo. Sou ações. Sou paragens e andanças. E o sol que me ilumina, cede espaço para a lua que me nina. Sou raios de sol e escondo-me nas horas das madrugadas. Sou riatura que cria o caminho e a curva.
O que me espera depois da curva, são os frutos que eu semeei no caminho e recebê-los justamente é sinônimo da sabedoria que adquiri passo a passo. Vida a vida. Dia e noite nesses ponteiros de flores do relógio que o tempo (dês)governa.