Visitas da Dy

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Cavalgando Leões





Experimento, mais do que nunca, o paradoxo da vida. Essa alegria dolorosa, esse esvair de tempo que parece infinito sob nossos pés, esse caminhar na beira de um abismo que não admite paradas nem desistências. É um lobo que nos desafia por fora e por dentro. Que olha nos olhos, que pisa em brasas, que descansa admirando a lua. É um leão feroz que ruge em nós e para nós, impulsionando. Talvez viver seja só isso: saber-se lobo ou leão. Domar-se e deixar-se livre, sem medidas exatas. Só seguindo as trilhas.
Busco equilíbrios para que eu não caia daqui do alto desse abismo. Há a possibilidade do voo, eu sei, mas ainda não são claros os limites de minhas asas. Ainda desconheço o tamanho da minha coragem frente à queda livre da vida. O que sobra é a consciência de que mais um dia, menos um dia, o caminho se estreitará e terei de me lançar.
Viver talvez seja cavalgar nesse leão selvagem. Seja desenvolver a arte de domá-lo. E esse leão me habita e eu habito nele, somos um. É como a primeira noite de um viajante sob um céu desconhecido e almejado. É como uma insônia ansiosa e alegre, que cede lugar à aflição quase sufocante das expectativas que crio. E das dores que degusto ao recolher meus cacos pelo chão.
O paradoxo é tamanho que já busco consolo frente ao natural. Ao rumo certo que todos tomaremos um dia, mas que causa absurdos em minha alma e revira todos os conceitos semiperfeitos que construí ou me apropriei ao longo da jornada.
Se a via é de mão múltipla, o destino é um só. A linha de chegada está no mesmo lugar para mim, para você, para todos. E sobre isso há a pseudo ignorância que me dá calmaria e possibilita respirações tranquilas.
O problema está na evidência. Evidenciada a brevidade do tempo, a efemeridade, bebo goles amargos de realidade, de consciência, doses cavalares de pontos finais inevitáveis que me tiram o sono, me arremessam em vales de lágrimas mais salgadas do que pensei.
Volto a cavalgar meu leão indomado e transformo-me nele: sem rumo. Sem o menor senso de direção, por mais que saiba que só posso ir para frente. Do fundo de meus quereres impossíveis não desisto. Há a fé. Há, sobretudo, a simpatia pelos milagres: os pequenos que observo e guardo na lembrança e os imensos, dignos de odes, que espero.
Volto a transformar o vale de lágrimas em vale de cristais. É uma tentativa de colorir o entorno. É uma tentativa de desenhar arco-íris com giz nas paredes recém pintadas de cinza. Funciona. Distrai. Acalma.
Domo o meu leão. Domo-me a mim. E lembro, mais uma vez, que estou à beira de um abismo, que a caminhada é inevitável e necessária. Que tenho asas e as saberei usar. Que tenho dores e saberei curá-las. Que tenho paisagens que inspiram e as cantarei em poemas. Que construirei meus castelos de areias ou de nuvens, mas não me pouparei os esforços de ser e fazer.
Talvez a vida seja só isso. Exercício diário de tentativas de se entender os paradoxos e mirar como se houvesse um alvo cuja recompensa por acertá-lo valha toda essa pena, todo esse esforço. Tento.


Sobre as Saudades Minhas de Cada Dia





Se minha cama é, de fato, um lugar onde as saudades habitam, se é em meu travesseiro que elas me aguardam todas as noites, recostarei apenas para um cochilo hoje. E todos os dias em que eu sentir esse misto de medo, de pequenez, de não-saber, de não-querer-lembrar.
A noite foi feita para pensar. Ou para sentir saudades. O problema é quando essas saudades teimosas crescem tanto que não cabem no curto período de tempo em que me deito e adormeço. Ou ainda, quando elas não me deixam dormir, ou invadem os sonhos, e resolvem fazer barulho no meio do meu dia.
Tem saudade que é grande, muito grande e dolorida. Eu não queria ter esse tipo de saudade. Queria ter só as saudades boas, as que não doem, mas me fazem lembrar da barriga que doeu de tanto rir. Mas eu não controlo as saudades.
Eu não queria que as saudades reinassem nas minhas madrugadas. Muito menos que elas carregassem essa pontinha de medo que tenho sempre que olho para a cama e enxergo meu travesseiro como um berço de saudades.
Mas ela vem. Rainha soberana do meu espaço entre o sono e o adormecer e invade o quarto. Minha saudade chega a ser cruel: tem gosto, cheiro, textura e a vejo bem melhor de olhos fechados, mas se abro meus olhos e toco a penumbra com meus castanhos, ela ali está, deixando-se perceber.
Não há como ela deixar de ser tão luminosa. Não há como eu convertê-la em outra coisa se não em si mesma: a saudade... Esse vão entre o que foi e o que faz falta. Esse oco entre o que eu gostaria e não foi... Esse trem desgovernado que se antecipa nas linhas férreas do meu peito.
Agora sinto saudades antecipadas dos dias que estão por vir e passarão por mim sem que eu lhes dê total atenção. Daqui a pouco virarão saudades. É nesse momento que me darei conta de tê-los vivido? Ou é nesse momento que me darei conta de que poderia ser melhor? Vivo? Existo? Amo e declaro ou só invento cores?
Essas saudades minhas de cada dia e noite mostram-me o quanto ainda questiono. O quanto não sei lidar com as descobertas, com os sentimentos, com a lógica da criação. É uma revelação do meu despreparo para o fim dos dias. É a certeza de que eu gostaria de viver muitos prolongamentos e os vivos: são as minhas saudades!
Talvez as saudades que me levante tantas questões sejam as minhas respostas: se há a saudade, houve o momento. Ou a vontade. Ou o despertar. E, por vezes, tudo o que eu preciso pelas manhãs é isso: despertar, que é muito mais do que só levantar da cama e trocar o pijama. O que preciso é abrir os sentidos e receber todas as sensações!
Que me venham as saudades! Que me vá embora o medo dessa tolices cotidianas e que haja o despertar efetivo, aquele que vai me trazer novas e boas saudades que repousarão tranquilas em meu travesseiro todas as noites!


quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Nudez




Entre as quatro paredes que se faziam cegas ante a todos os tipos de casais que se despiram ali, a nudez jamais havia sido completa.
Desabotoadas as roupas, largadas ao chão, misturando-se em uma quase confusão de ansiedades, vontades e pressa, os corpos eram só isso. Vitrines opacas de algo bem maior, mas não completamente visível, talvez sequer insinuado.
Os corpos se exibiam como texto em braile, prontos a serem tateados, superfícies sensoriais não menos enigmáticos que os códigos antigos. Não menos incompreendidos que os esconjuros de séculos passados.
Naquela hora e pelas poucas que se seguiram, eles se bastavam. Mas sabiam-se poucos. Sabiam-se muito mais líricos e íntimos do que aquela aparente nudez carnal que logo seria um balé de saciedades quase tão breves quanto a nota solitária de um violão ou um primeiro gole de vinho encorpado. Um respiro. Um suspiro.
A completude da nudez nem sempre necessita da ausência dos tecidos, emaranhados de fios e estampas, mas tão somente do retalhamento (da carne) e da exposição (não livres de dores e medos) dos remendos que guardamos no peito. A nudez de fato é a exibição do coração, da alma, do que se sente. É preciso deixar nossa composição à vista, sem prazos. Quase uma partitura aberta, pronta a ser tocada com a suavidade e a urgência que cabe a cada nota.
Talvez seja por isso que aquelas paredes se faziam cegas: estavam cansadas das superficialidades, das banalidades, dos lugares comuns que presenciavam. Ainda não tinham experimentado a verdadeira nudez de nenhum de seus ângulos. Nenhuma entrega real, sincera. As paredes estavam exaustas da mesmice, da sensação de deja vu que ecoava pelo quarto a cada novo casal.
Imóveis, as paredes só podiam esperar por um pouco mais de sinceridades reais, de aberturas, de essências, de pessoas que estivessem dispostas a se permitirem de verdade.

Enquanto isso, o tempo passava, os corpos passavam e só permanecia a sensação de que algo sempre se perdia entre as várias oportunidades da experimentação da nudez que ficam pelo chão.

sábado, 17 de janeiro de 2015

Como Soy - Lucia Tacchetti - Letra


Garimpando na internet por músicas em espanhol que pudessem me ajudar a estudar o idioma, encontrei essa preciosidade que é Lucia Tacchetti. A canção Como Soy é belíssima e, como não encontrei a letra disponível, transcrevi.
Seguem, então, o vídeo e a letra!
Surpreendam-se!


Como Soy
(Lucia Tacchetti)





Actúo raro me mido lo pienso analizo qué sentirás
Pues no puedo ser natural 

Me da miedo saber qué dirás
Está mal no es correcto no sirve de ejemplo quererte agradar
Pues al fin me conocerás y todo caerá
Me voy relajando y te voy dejando conocerme más
Sigo sin saber qué pensás pero ya me da igual
Me enrosco en palabras

Me ahogo en el agua
Así es como soy hablo cosas sin solución
y te quiero decir quién soy
Testaruda hasta el fin

Sensible como un jazmín
Me siento segura pero en el fondo soy un poco muda
No sé discutir sólo digo que sí
Me gusta el helado y en verano no uso calzado
Me tropiezo en todos lados

Lo femenino lo dejé de lado
No sé de formalidad

Sólo se sonreír y sentir
Me voy relajando y te voy dejando conocerme más
Sigo sin saber qué pensás pero ya me da igual
Me enrosco en palabras me ahogo en el agua
Aasí es como soy hablo cosas sin solución
Y te quiero decir quién soy
Testaruda hasta el fin sensible como un jazmín
Me siento segura pero en el fondo soy un poco muda
No sé discutir sólo digo que sí
Me gusta el helado y en verano no uso calzado
Me tropiezo en todos lados lo femenino lo dejé de lado
No sé de formalidad sólo se sonreír y sentir

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Ar-Dor



Seguem as horas.
Seguem os grãos de poeira a dançar no ar.
Tudo é novo. Nada me encanta. Tampouco tenho vontade de explorar: seja esse quarto de hotel, seja a cidade lá embaixo, ainda quieta, ainda fria.
Dentro de mim, ainda está tudo meio morno. Ainda alimento dúvidas. Agora penso em acender um cigarro, pegar uma bebida ou dar um cochilo enquanto a cidade não começa seus gritos ensurdecedores e insistentes que não me deixarão descansar.
Deito. Não durmo. Rolo. Não caio. Nessa cama que acolhe meu corpo, despejo meu mundo e pouco caibo nele ou ele em mim. Somos uma simbiose, mas não há pleno acordo entre nós.
Começo a arder.
Há no ar uma dor.
Há um ardor.
Respiro esse bafo quente e úmido, coisa de litoral.
Da janela avisto uma praia que desconheço, como todo o resto da paisagem lá fora.
O dia está cinza e caberia em um cinzeiro. É um dia daqueles que amanhece pálido e com uma aparência adoentada. Faltam-lhe alegrias. Falta-me algo. Somos dois incompletos: o dia e eu.
Parece-me que essa paisagem e esse dia desconhecem a finitude. Pousam na linha da eternidade. Estou ardendo. Estou em estado de quase febre: ardo essa eternidade. Sinto o peso de ter vivido séculos, como se tivesse protagonizado cada uma das histórias que li, cada uma das histórias que escrevi.
Não caibo mais na cama e muito menos em mim. Não refresco meu estado febril nem as ideias ou a cabeça. Sou brasa. O mundo, meu braseiro. Sigo ardendo e quase tudo não me basta. Toco as cinzas do dia com a ponta dos dedos e renasço: sou uma espécie de fênix, que só sabe o que é a vida quando arde.

Tateio o desejo de frescor e incendeio: desconhece o morno quem nasceu pra ser fogueira.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Questionamentos



Sobre os homens, o mundo, as bombas
E balas perdidas que acham pessoas.
Sobre não saber onde foram parar os limites,
Onde está o bom-senso e a noção.
Sobre para onde foi a civilidade, a gentileza, o cuidado.
Sobre ser ou não ser, matar (de rir?!) ou morrer.
Sobre essas coisas que chamam fronteiras, essas barreiras...
Tantas línguas que não se entendem e fogem dos beijos
Sobre os dedos que não se acariciam,
As mãos que não se dão.
Sobre as preces não atendidas, lamentações, orações.
Sobre as dúvidas acerca de Deus e seus tantos nomes.
Sobre esses questionamentos que me assombram,
A falta de sono, a madrugada que vai alta, a lua que se encolhe.
Sobre a falta de tempo, a escassez de sentimento.
Sobre tudo isso, meu Deus, sobra tanta falta de resposta!

E o mundo se configura em roda viva, cujo sangue jorra.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Ao que se gerou



Nove luas se passaram
Nove mundos inventei
E em cada um deles o amei.
Destaquei seu nome sobre todo nome.
Escolhi a dedo cada letra,
Cada som que ecoaria em meus ouvidos
A canção mais linda.
Com um pincel delicado desenhei seus traços
Do verde profundo dos mares
Busquei seus olhos,
Mais valiosos que esmeraldas.
Para suas palavras, imaginei poesias,
Rimas ricas, livros raros,
Tesouros que guardei com cuidado.
Fiz de seus dedos meus versos,
De seus passos a inspiração,
Nenhuma delas capazes de representar
O meu amor em profusão,
O sublime e intocável sentimento
Que o fez brotar, primeiro em meus sonhos,
Depois em meu ventre.
Acolho-o, filho meu, com braços-ninho,
Aconchego, acalanto, pousio.
Guardo-o, filho meu, como joia,
Precioso presente, lampejos de futuro.
Gerei-o, filho meu, eternidade minha,
Príncipe de meus castelos,
E carrego o fardo de ter meu coração
Fora do peito,
Correndo serelepe pelo mundo.
Alegrando meus dias,

Chamando meu nome.

Melancolias II



Invade-me, às vezes,
Um mar de melancolias.
Com ondas de espumas tão brancas
Que mais parecem salpicadas florezinhas.
O mar inunda-me,
Enche-me
E quase sufoca.
Sinto nessa hora
Vontades de chorar
Um choro liso, limpo, sincero.
Um choro incontido,
De sal grosso, cristalino,
Que me faz soluçar.
Que me liberta.
Que salva da agonia momentânea.
Que arde os olhos,
Queimando, como fogo, tudo o que vejo.
Ah, mar de melancolias
Bem sei que sou eu quem verte o seu sal.
Bem sei que é seu o meu consolo.
Bem sei que você sou eu
E que, como as suas ondas,
Tudo passará.
Inclusive eu.



segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Primavera Antecipada





Para todo inverno que me cerca
Seus abraços, lembranças calorosas.
Para a boca de café,
Seus beijos, sabores nostálgicos.
Para o vento que me invade a janela,
Meu vestido que balançava ao seu passo.
Para a ausência de cor,
Seu perfume dentro de um livro:
Primavera antecipada,
Que traz  consigo meus desejos
Sonhos de uma noite de verão.
Acordo.
Ainda é inverno.

Aqueça-me!