Visitas da Dy

terça-feira, 4 de julho de 2017

Dignidade





Passou a tarde tentando entender a essência da dignidade humana. Sua estreita relação com o amor próprio, esse valor tão (quase) esquecido e ofuscado pelos refletores das necessidades frívolas.
De certo que, insistir, por vezes esbarra não só nos quereres e vontades, mas na perda essencial de um valor, da auto estima por si mesmo e isso não é algo fácil de lidar quando a cabeça pousa no travesseiro.
Agora, entre o vazio que lhe habitava o peito, como um ninho abandonado, restava um tico de lucidez desajustada pela luz do quarto, sinal ofuscante que parecia dizer: tente outra vez.
Queria tentar. Queria lançar a palavra-convite mais uma vez. Queria dar-se mais uma chance. (Lá no fundo sabia que a chance não era para si, mas uma meia verdade a essa hora nem era caso grave).
Queria a procura ou pelo menos o golpe de misericórdia vindo direto, sem rodeios, sem farsa: as meias palavras não bastavam. Os lábios emudecidos não bastavam. Queria a dor do golpe certeiro e sincero, fosse qual fosse a sentença, a receberia.                      
Era um misto entre o medo da rejeição e outro medo, o do prolongamento vago e sem intenção. Talvez precisasse de uma dose de uísque e um trago de cigarro, mas não bebia nem fumava. Plano descartado.
Talvez um conselho, um livro de auto-ajuda ou uma boa olhada no espelho...
Talvez, àquela altura da vida, perder a dignidade já nem fosse um crime imperdoável e a insistência fosse entendida apenas pelo que deveria ser: vontade. Pensou mais um pouco e escreveu o que bem quis. Ao enviar ao remetente se arrependeu. Era ela, a morte anunciada, a agonizante dignidade estirada pelo chão, à espera de um milagre, de sua ressurreição.
Ainda bem que era uma sexta-feira e, aleluia, o milagre se daria tão logo: ressurgida, a dignidade se recuperaria a passos lentos, mas a sensação de arrependimento ainda perduraria até a nova lua.

Das vontades declaradas, poucas chegam vivas às satisfações: é que tudo é vário, incerto e breve. E queremos sempre mais do que é dado, menos do que merecemos.

0 Comentários:

Postar um comentário