Passou a tarde
tentando entender a essência da dignidade humana. Sua estreita relação com o
amor próprio, esse valor tão (quase) esquecido e ofuscado pelos refletores das
necessidades frívolas.
De certo que,
insistir, por vezes esbarra não só nos quereres e vontades, mas na perda
essencial de um valor, da auto estima por si mesmo e isso não é algo fácil de
lidar quando a cabeça pousa no travesseiro.
Agora, entre o
vazio que lhe habitava o peito, como um ninho abandonado, restava um tico de
lucidez desajustada pela luz do quarto, sinal ofuscante que parecia dizer:
tente outra vez.
Queria tentar.
Queria lançar a palavra-convite mais uma vez. Queria dar-se mais uma chance.
(Lá no fundo sabia que a chance não era para si, mas uma meia verdade a essa
hora nem era caso grave).
Queria a
procura ou pelo menos o golpe de misericórdia vindo direto, sem rodeios, sem
farsa: as meias palavras não bastavam. Os lábios emudecidos não bastavam.
Queria a dor do golpe certeiro e sincero, fosse qual fosse a sentença, a
receberia.
Era um misto
entre o medo da rejeição e outro medo, o do prolongamento vago e sem intenção.
Talvez precisasse de uma dose de uísque e um trago de cigarro, mas não bebia
nem fumava. Plano descartado.
Talvez um
conselho, um livro de auto-ajuda ou uma boa olhada no espelho...
Talvez, àquela
altura da vida, perder a dignidade já nem fosse um crime imperdoável e a
insistência fosse entendida apenas pelo que deveria ser: vontade. Pensou mais
um pouco e escreveu o que bem quis. Ao enviar ao remetente se arrependeu. Era
ela, a morte anunciada, a agonizante dignidade estirada pelo chão, à espera de
um milagre, de sua ressurreição.
Ainda bem que
era uma sexta-feira e, aleluia, o milagre se daria tão logo: ressurgida, a
dignidade se recuperaria a passos lentos, mas a sensação de arrependimento
ainda perduraria até a nova lua.
Das vontades
declaradas, poucas chegam vivas às satisfações: é que tudo é vário, incerto e
breve. E queremos sempre mais do que é dado, menos do que merecemos.
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