Eu já estava
acostumada com seus silêncios longos, mas gostava mesmo do som da sua voz.
Aceitava a negação do som de suas palavras como se fosse a única alternativa de
compreensão.
Convencia-me
de que a distância era um respiro, uma necessidade vital. Eu definhava
saudades. Mas parecia feliz: a sua ausência era a presença mais constante que
eu tinha. E aquela foto na cabeceira.
Eu já estava
acostumada à espera da palavra escrita que rompia a barreira do não-som. E eu
sentia vontades de bailarina diante do texto que ganhava a cor e o tom que eu
dava.
Eu perdi a
conta dos dias. Esqueci do som que tanto me aprazia. Esqueci o rosto, o gosto,
o sonho e o sono em algum canto de caixa empoeirada na sala. Esqueci tantas
outras coisas que nem as horas importavam. Os vazios diminuíram e algo, antes
rompido, foi reconstruído de modo mais fechado, mais cuidadoso, apreensivo, até
medroso.
Esqueci o
toque do telefone, a música preferida, os versos que compus. Passei a gostar do
silêncio e a contemplá-lo como dádiva.
Mas quis a
sorte me testar e não houve palavra escrita, mas dita, naquele dia de chuva e
frio e conheci na voz que antes me afagava o fino corte de navalha.
O silêncio
rompido estilhaçou-se pelo chão e junto, não nego, atordoou-me o coração. Que
fazer diante do susto, do espanto, do assombro? Aceitar que nem o silêncio nem
a dor eram velhos o bastante para terem morrido. Aceitar que só muito aos
poucos é que o tempo tem eficácia e conviver com as brumas do passado que ainda
visitam o presente.
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