Visitas da Dy

domingo, 7 de dezembro de 2014

Explicações



Entre saltos altos e livros, sou fútil e sensível. Beijo a poesia e declamo a flor com o mesmo vermelho nos lábios. Quase vício. Quase rotina. Quase prece decorada.
De ventos e tempestades, calmarias e ímpetos, sou violentamente delicada, violetamente magoada pelas dores que nunca experimentei, como as florezinhas que tenho no vaso. Azuladamente tranquila nas ansiedades das flores de maio no mês de novembro.
Superficialmente absorvo os silêncios e os converto em lástimas de tudo o que se perdeu empurrando garganta abaixo, tudo o que foi bebido à seco, tudo o que de tão mal chegou a fazer bem: faz parte do processo esse exercício de conversão.
Nobremente sufoco os sentimentos vis, metamorfoseio minhas sombras em tons iluminados, escondendo meus espinhos dentro de minha própria carne que sangra tons alaranjados de alegria gratuita a cada novo nascer do sol, à espera de que o verde das indecisões amadureça e floresçam jardins de sabedoria.
Ainda há canteiros de terras transparentes em mim, esperando os florescimentos multicoloridos das auroras boreais de bocas cujos céus esperam por eclipses de beijos.
Sou de emoções que nem sempre permanecem, entre a continuidade e a ruptura, sou passo dado no abismo, sou a busca pela explicação exata do que é a substância que compõe a alma. por mais que saiba que nem tudo se explica, que a interrogação nem sempre se refaz em exclamação.
Sou tendenciosa a seguir as pistas, acreditar no que está escrito ou no que foi dito, impaciência natural de água de rio que afoga as pedras do relevo e serpenteia como criança birrenta pelos vales e se joga, atrevida, de altos de morros, com cabeleira-queda-d’água ao vento.
Em noites de lua alta e muito calor, o desassossego deixa de ser livro de cabeceira e assume seu lugar cativo no peito, crescente como sonhos de Oriente, curioso na fronteira do que era o sim ou o não, escorregando nas curvas de toda interrogação.
Tudo me prende, nada me interessa e se interessa e sacia, é finito. E se é finito, desmancha e nada sobra. E os laços do novo são frágeis, quase transparentes a quem não os compreende, e os desamarro mais pelo prazer de desfazer o pacote do que pelo apreço de guardar o conteúdo.
Transbordo tudo o que vejo e esvazio-me do dom de errar: sejam pelos caminhos pelos quais tento me encontrar, sejam nas respostas que ouso dar. É quase como brincar de ser camaleão e camuflar-me nas curvas do caminho.
Fixamente observo o além-mar-montanha-horizonte, decorando as entonações que cada poente recita aos meus olhos e para todos aqueles que não entendem, recolho os fios das meadas emboladas, teço rede amarrada em nuvens de pensamento e repito os versos que nunca decorei: são os preferidos e por isso devem ser redescobertos. E poucos entendem essas explicações.
Descrevo os arabescos de meus sonhos com palavras entremeadas, paisagens fotográficas, arquiteturas mouras de meus devaneios desérticos que contemplo sem fronteiras entre o ouvir, o ver, e o falar, porque sou um completo descaminho de caravaneiros que não teme as tempestades de areia e nem a falta da lua, ao contrário, se rende a ela em cada uma de suas fases.
Repito-me sempre. Sou mais do mesmo, mas nem sempre a mesma, paradoxalmente. Há mudanças nos detalhes. Nos mínimos. Só olhos atentos percebem. Só a eles me revelo, se é que revelo.
Faço as mesmas perguntas várias vezes porque esqueço as respostas e divirto-me com as mesmas piadas. Essa é a leveza de dente de leão na imensidão azul que eu quero ter a partir dessa hora, que marca um novo início para todos os meus dias.
Gosto de sentir com os olhos, ver com os ouvidos e ser tocada pela língua, falada e quente. Gosto de ver as cores das pessoas. As cores que elas imprimem em si mesmas quando contam seus segredos, quando dão um bom dia, quando não sabem o que fazer ou quando estão perdidamente enroladas nos sabores de suas próprias histórias. Gosto de falar, mas também de observar e um tanto de ser observada, enigma decifrado.

Gosto, ainda de pensar que, no fundo, eu sou uma narrativa complexa, de palavras simples, delicadamente organizada por dedos caprichosos que esqueceram as notas de pé de página, que ajudariam qualquer leitor, muito mais pelo prazer de ver as caras e bocas de quem lê do que de ajudar o texto-eu a ser compreendido. Gosto de pensar que tenho momentos de prosa e verso, que tenho dias de rima e outros de falta de nexo, que às vezes sou abstrata e, em outras, concreta, sou idas e vindas e esperanças. Sou livro de cabeceira de escritor inquieto: nunca finalizado ou completo.

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