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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Para Todo Dia




Fosse quarta-feira e o ritmo seria outro. Na segunda, o pé estaria no freio, ainda preguiçoso. A mão estaria largada, tateando em busca do café-nosso-de-todo-dia. Mas era sexta. E apesar de todo o cansaço da semana, das correrias, dos ônibus perdidos, das horas atrasadas, das reuniões intermináveis e enfileiradas de segunda a quinta, como as filas das crianças na escola, a aceleração era total.
Poderia ter feito versos. Poderia ter ouvindo uma canção. Preferiu pensar em todas as palavras que poderiam ser escritas e endereçadas, mas não o seriam. Gostava de escrever essas longas cartas que não eram entregues a ninguém.
Jogou-se no sofá da cafeteria como se fosse o de sua própria sala. Afundou-se no meio das almofadas, sacou o caderninho e anotava tudo. Observava tudo. Com um som alto nos fones, perdia-se na contemplação do vai e vem das pessoas.
Gostava de ir ao shopping. Não de ir às compras, mas de sentar ali, na poltrona que já era quase sua e passar horas olhando as pessoas. Gostava de tentar imaginar o que se passava nas tantas cabeças que entravam e saiam das lojas, que se escondiam atrás das sacolas com produtos caros e que nem sempre eram necessários a todas aquelas pessoas.
Gostava, na verdade, de sentir-se desligada de tudo aquilo. Como se fosse só mais uma expectadora do mundo, uma fiel seguidora das histórias, das mil histórias sem fim que era a vida.
E sempre se pegava imaginando os fios que ligavam as pessoas, sem o menor dos sentidos lógicos, sem nenhuma outra explicação que não fossem um capricho dos novelos das Moiras.
Em dias acelerados como essa sexta-feira, gostava de cafés gelados, de energias revigorantes e refrescantes que a permitiam mais lucidez ao olhar para cada passo das pessoas e lhe permitia examinar a sua colocação no meio de todo aquele mar de histórias interligadas.
Pegava um ou outro fio e ia tateando para encontrar o exato momento em que o cruzamento acontecia. Encontrava, mas a lógica lhe fugia. E dessas experiências de pausa e observação tirava a sua receita para todo dia, de meditar, de concentrar-se nos acasos interessantes que os caminhos, suas voltas e atalhos proporcionavam. E anotava em seu caderninho cada um dos seus pensamentos. Como se pudesse compor um livro dos dias. Um livro de horas. Um livro de intermináveis histórias sem fim, com personagens que iam e vinham a cada nova página lida, escrita, reinventada.

Para todo dia, uma nova anotação. Para todas elas, uma dose de contemplação. E fazia-se assim, um pouco dona de tudo o que seus olhos viam e tocavam sutilmente pelo correr das horas que mergulhavam em mais uma taça de café gelado.

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