Segurava seus desejos na mão como se fosse a própria lua. Ela tentava
controlar as suas fases. E oscilava tanto quanto as marés.
Dona de muitas vozes entregava-se nos silêncios que fazia. Não sabia
dar-se às indiferenças e condenava-se sempre ao mais profundo dos calabouços
todas as vezes que tentava dominar as suas palavras. Ré confessa, agora deixava
os pensamentos saírem pela boca, fosse o resultado qual fosse.
Se precisasse tecer uma defesa trabalharia em cima da única coisa pela
qual tinha certeza: nunca causara o mal de propósito. Nunca derramara a última
gota consciente. Nunca desviava um caminho sabendo que o atalho era falso. Isso
não.
De uma leveza que lhe era peculiar, preferia arcar com as dores dos
outros – causando muitas em si mesma – do que correr o risco de ferir quem quer
que fosse.
Encolhida em seu canto contabilizava os destroços que encontrava ao seu
lado. Quantos deles foram resultados de suas ações? Quantos navios naufragados
por seus ventos? Estaria ela dando-se um crédito maior do que o real ou era
mesmo de uma natureza intempestiva, dessas que pode destruir sem perceber?
Em suas muitas fases, cabiam-lhe mais as pressas e belas violências das
cachoeiras, as inconstâncias e insatisfações das marés, os mistérios noturnos dos
rios profundos ou era só um lago calmo, quase adormecido que sonhava em ser
mais?
Segurando as suas vontades como se fossem as fases da lua, ela esperava
cada uma delas passar. Às vezes engolindo a seco o sabor que nunca
experimentara, outras tantas deixando de lado, acostumando-se ao nada e ao
deixar-se-ir-das-horas.
Era lua, era de fases, era ré e inocente ao mesmo tempo, tentando
equilibrar-se em sua existência ora de sol, ora de lua, mas sobretudo de luz. E
pouco interessava se era ouro ou prata. Brilhava. E contentava-se com isso. Contentava-se
com o fato de existir.
Inocente das intenções, mas testemunha de crimes. Portadora de feridas
que lambia inquieta. Insatisfeita com o que tinha, acomodada com o que não
alcançava. Delicadamente áspera, com tantos espinhos quanto perfume. Desesperadamente
esperançosa. Um ser de lua em busca da compreensão de si e do mundo, que
perdia-se nas noites, contendo em suas mãos seus desejos, que passariam, como
todas as fases.
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