É como descobrir-se sem que se conheça. É domingo de sol sem nada para
fazer. Ou com tantos afazeres que vira segunda-feira. É sentir-se às avessas e
nada poder fazer.
É uma sensação de cansaço que beira a desilusão, que beira solidão, que
beira o desconhecido e que entontece qualquer um. Que se entranha nos
pensamentos e esvazia as ideias, que tira o ar, que deixa o último fôlego se
esvair, assistindo a tudo com frieza de concreto.
É como um feriado em dia de domingo com aquela sensação de que não
valeu. Parece pênalti roubado, folga desperdiçada, chuva que cai depois que se
lava todas as janelas mais altas. É um desânimo interminável que precisa ser
vencido.
É um abismo com fundo. Mas com tantos riscos quanto o passo em falso
pode assegurar quando o sem fundo é a garantia. É a certeza do baque forte que
quebra tudo, desmonta sonhos, desloca pensamentos.
É uma incerteza de se existir ou viver. É a incerteza de se entender a
diferença entre uma coisa e outra. Ah, quantos existem e não vivem... e quantos
vivem tanto que chegam a incomodar quem só existe!
É a dúvida de não saber-se ser ou estarrecer. É sentir-se no meio do
mundo em queda e não se reconhecer. É não ter para onde correr, mas ainda assim
seguir e buscar forças para não desistir.
Acordar todos os dias é um exercício diário de pequenas conquistas,
pequenas vitórias: sobre o despertador, sobre a vontade de ficar na cama, sobre
o horário que passa voando, sobre cada decepção, sobre os maus agouros, sobre
toda a gente que está ali só para servir de obstáculo.
Acordar todas as manhãs é um exercício de fortalecer-se sem esquecer das
delícias que se alcança quando cada um desses desafios é ultrapassado.
Em tempos de cansaços, de muitos motivos para desistir, ainda consigo
enxergar que o mundo contém todos os desdobramentos possíveis, para o bem ou
para o mal, e que mudar os rumos ou manter-me de posse da mesma cópia feita de
um original desigual depende mesmo é de minhas vontades.
Em tempos em que me sinto abstrata, presa em concretos e conceitos que
parecem limitar, busco as beiras, as fronteiras, os liames e teimo em passar
por cima ou por baixo das cercas que insistem em reduzir meus pensamentos.
Já não é de hoje que tentam me calar, mas ainda há o grito que posso
dar, ainda há a angústia em que posso (quase) afogar-me e experimentar umas
poucas gostas de amargo, só pelo prazer do diferente, sem deixar me abater
completamente, sem desistir de ver ao chão cada caco desses espelhos
distorcidos.
Não é de hoje que há uma busca por um não sei o quê e talvez esse seja o
motivo do falso cansaço: o não saber. Uma busca às cegas tem seus prejuízos,
mas uma certeza de se achar soa como um realejo ao longe, que muito mais do que
a sorte, aguarda a mão que lhe dará corda e libertará seu som, leve como as
notas de uma harpa suave. E os pés poderão dançar sua música. E aceitar a sua
sorte. Acreditando ou não nela.
0 Comentários:
Postar um comentário