Visitas da Dy

quarta-feira, 10 de maio de 2023

Comer o mundo

 




Eu nasci com a boca bem aberta,

Escancarada em gritos de estreia.

Uma fome de sugar todo peito que aparecesse,

Desde que fosse cheio de histórias.

Um choro alto, de anúncios de revoluções.

Eu nasci com uma fome de mudanças.

E cresci levantando bandeiras,

Derrubando mastros-fálicos opressores,

Erguendo possibilidades de novos ares.

Nunca me dei por saciada.

Tenho, hoje, uma boca pintada de vermelho

E cheia de dentes, de quem rosna e morde.

Tenho uma boca de quem quer comer o mundo

E, claro, declamar o amor.


terça-feira, 9 de maio de 2023

Amuleto grego

 





Seus são os caminhos do tempo 

E onde ousa por os pés, florescem

Bandos de histórias sem fim

Que nascem do oriente de seu colo

Ao ocidente em que se deita.

Assim como também são seus os sorrisos das Ninfas

Já que carrega realejos nas gargalhadas.

Benditas as estrelas noturnas que são seus olhos.

Benditas as estrelas que descobre nas noites de véspera

A cada vez que amanhece em meus braços

E louvada seja a sua liberdade de tempestade

Que rasga o céu de meu peito à sua partida

Para se abrir em preces diante de sua chegada.

Carrega mil bençãos de porvir em sua voz,

Mil maldições esmagadas em seu calcanhar,

Arranjos de fogo-fátuo emolduram seus cabelos

Pois, diante do exposto, é Medusa às avessas:

Aquela, paralisa, você, traz movimento.

E, há quem

 diga, afasta o mal.

quinta-feira, 4 de maio de 2023

Não é (só) o céu sobre nós

 


(Foto gentilmente cedida por Saulo Otoni, em 04 de maio de 2023 - Serra do Brigadeiro.)




Há aqui mais que a poesia branda 

Há minhas querências e seus olhares (pelo mundo).

Há aquele meu desejo de brigadeiro: 

de um céu todo só para você voar.

E você voa. Voa até o Brigadeiro

E me enche os olhos de vontades tantas

Que posso contar as estrelas nascentes 

só para acompanhar o desfile de brilhos, 

O escorregar negro da noite,

As rendas que deveriam ir ao chão, 

negras de madrugada e abismo noturno.

Quis ser  (ou ter) seus olhos hoje.

Estar sob esse céu acastanhado,

Envolvida pelo verde e pelo desejo.

Quis estar imersa nessa paisagem. 

Respirar suas cores...

Abrir meus versos e olhos de infinito,  

Buscando promessas de um mundo inteiro

Que lhe entrego todos os dias e você não vê.


terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Dom e Conquista

 



Dos talentos todos,

Gostaria de ter herdado dos céus, o amor.

Esse dom quase mágico,

De margens desconhecidas,

De transcendência e doação.

Faltou, de fábrica, essa habilidade.

Tentei a sorte, então, pela conquista.

Lancei-me em aventuras,

Desbravei corpos e madrugadas.

Colecionei sussurros e confissões.

Por vezes, cri estar perto do prêmio:

Acolhida no afago das paixões, mas, essas, breves...

Tão logo amanhecia, eu me ia e fim.

Restaram-me as horas de contemplação e sonho.

Há lugares que não alcanço.

O amor é um dom e uma conquista.

Falhei miseravelmente.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Amar é observar

 




Fiz uma prece.

Um sussurro.

Um nome.

Era minha forma de amar.

Era reconhecer a carne

Que a alma habita.

Era tocar o intangível.

Era o romper da solidão

E o ato de imergir no silêncio.

Amar é saber observar

sábado, 11 de fevereiro de 2023

Lambuzar-se

 



Dedico-me ao trabalho

Ao sacro ofício de fabricar mel,

Delícias e prazeres para lhe ofertar.

Transitando entre ser a rainha

E a construtora de favo-sonhos,

Quero entregar-lhe o mel da vida, 

 Que nutre e fortalece,

Que em fartura, suave, escorre

Pelos seus dedos e enche as mãos.

Que escorre pelo canto de sua boca.

Mel que transborda da união.

Mel de nossa partilha.

Mel abundante, que de minhas profundezas,

Nasce e jorra

E que não cabe ao desperdício.

Prove-o. Tome-o. 

Lambuze-se!

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Repúdio in versus

 


(Poesia-repúdio em defesa da Democracia, da República e do Patrimônio Cultural, Histórico, Artístico e Arquitetônico vandalizados nos atos criminosos e bolsonaristas, em Brasília, no domingo, 08/01/2023).




Vi ontem, na imundície do pátio,

Animais ensandecidos, em galopes alterados,

Devastaram desde a grama

(Que outrora comiam) 

À arte que os representava

(Mas essa, eles não entendiam).

Vi ontem, um bando desordenado

Vomitando ódio, defecando escárnio

Em prédio público, em coisas públicas,

Pelo fato de serem mimados.

A cegueira dessa gente é de alma:

Pedem armas contra todos,

Mas quando voltam-se para eles, choram.

Essa gente grita, esbraveja e pede intervenção,

Mas quando ela chega, repudia a repressão.

Alegam estar dentro das quatro linhas,

Mas rasgaram a Constituição.

Diziam-se democráticos, 

Mas atentaram contra a Nação.

Fiéis cegos de um genocida,

Discípulos de uma plana geografia,

Oradores de rasa filosofia.

Destruidores da memória.

Manchadores do tempo e da História.

Seus nomes não serão esquecidos.

Estarão no hall da infâmia, 

Junto com outros bandidos.


terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Umbigo de Rosas





Em algum lugar de minha árvore ancestral,

Sou dos índios.

Lá onde o céu era mais infinito, 

A noite mais estrelada e profunda.

Em algum tempo ancestral,  

Semeavam-se cordões umbilicais

Em pés de plantas longevas:

Ambos teriam as memórias da terra, 

Ambos teriam as raízes da terra.

Em algum lugar do tempo,

Minha avó tomou-me dos braços de minha mãe,

E abençoou-me e elevou-me aos céus.

Meu avô semeou - ritual - ao Sétimo Dia,

Meu cordão umbilical ao pé da roseira.

Eram rosas vermelhas, suas preferidas.

Delas, compartilho a cor: vermelha como brasa,

Um tanto a mais de espinhos

E no umbigo carrego o cheiro de rosas.