Um dia
escolhi a História. Mentira! Foi ela que me escolheu. Eu era muito nova ainda. Uns onze, doze anos, no máximo. Fiquei
encantada com a possibilidade de saber como tudo aconteceu, porque estamos do
jeito que estamos hoje. A minha professora dizia que todas as nossas respostas
estavam no passado e não no futuro como a gente acreditava.
Lembro-me muito
bem da aula sobre os castelos. Não era nada daquilo que se passava nos filmes. Era
muito diferente, o contrário pra dizer a verdade. O tal do senhor feudal era um
bobo. Ele pegava toda a produção da fazenda e não deixava quase nada para o
camponês.
E os
dragões? Definitivamente, nunca existiram. As princesas não usavam vestidos
cor-de-rosa-bebê (mas e daí? Eu nunca gostei de rosa mesmo... nem de princesas!)
e os príncipes, bem, acho que a Disney se confundiu quando fez os desenhos... a
História, aquela com H maiúsculo, era outra.
Ano após ano
eu me perdia e me encontrava naquelas aulas de História. Livros atrás de
livros, filmes, músicas, pinturas, tudo me fazia sentir um cheiro de passado. Um
passado muito teimoso que achava que o seu lugar era entre a gente, que não
queria deixar de ser presente e que, se bobeássemos, estaria esperando a gente
no futuro.
Menos de uma
década depois de todo o meu encantamento eu estava no primeiro ano da faculdade
de HISTÓRIA. Sim, uma paixão avassaladora, um amor incondicional que só fez
crescer. Tornei-me professora. Não dessas de repetir o que se tem nos livros,
de se dar a mesma aula para todas as turmas todos os anos, mas longe de ser a
ideal. Só uma coisa eu tinha certeza: eu não tinha escolhido a sala de aula. Eu
nunca escolhi ser professora. Nunca escolhi ensinar. Foi a História quem em
escolheu. Foi ela que entrou na minha vida, encheu-me os olhos, virou-me para
trás e mostrou-me os caminhos do futuro.
Escolhida pela
História, perdi-me num sem fim de noite mal dormidas, de livros, textos,
escritos, rabiscos, ideais, sonhos e carreira. Ajuntando uma coisa com a outra
descobri-me apaixonada pela Idade Média e pelo Patrimônio Cultural.
Ainda me
pergunto como me deixei envolver tanto pela História... Deve ser porque gosto
de gente. Deve ser porque eu tenho uma vontade enorme de seguir dividindo todas
as coisas que eu sei. Deve ser porque eu tenho uma dívida enorme a pagar com a
sociedade que me possibilitou uma vida de mais de 20 anos estudando em escolas
públicas e de qualidade (é, no meu tempo as escolas eram boas!).
Formei-me em
uma universidade federal, fiz pós-graduação e hoje completo uma semana da
defesa de minha dissertação. É... o tempo passou e pouco mais de quinze anos
passados em que a História entrou em minha vida trazendo todo o seu
encantamento, seu espírito crítico e suas angústias sufocantes, eu posso dizer
que sou completamente feliz com a profissão que tenho e pela trajetória eu
venho fazendo ao longo desses quase dez anos de envolvimento direto com ela.
Ser historiadora
é uma questão de amor pelo presente. É um desejo absurdo de entender o que se
passa hoje, de responder os porquês que nos atormentam. Ser historiadora é
sufocante quando me vejo em situações que exigem um desprendimento de mim
mesma, mas que têm um objetivo maior. É gratificante quando vejo o
reconhecimento de meu trabalho em alunos tão maravilhosos que cruzaram o meu
caminho.
Para complementar
a História fiz uma aproximação com o Patrimônio Cultural e a Educação e o
casamento só me deu alegrias: hoje, mestre em Educação pela UFF, mas
eternamente historiadora pela UFJF, eu posso afirmar que não há no mundo
alegria maior do que ver um sonho concretizado.
Valeu a pena
cada lágrima, cada luta, cada suor, cada sorriso, cada desespero com prazos.
Hoje eu
realente consigo perceber o que foi vencer esses dois anos no Rio de Janeiro,
longe de casa, dos meus maiores amores – Heitor e família – em uma cidade
desconhecida, maravilhosa e cheia de incertezas.
Hoje, a
melhor imagem que posso ter é essa: minha mão espalmada sobre o peito que não
se aquenta dentro do corpo, que quer sair a bater pelas ruas, quer espalhar
toda sorte de boas vibrações por aí, quer mostrar que ser professora é uma arte
e que ser historiadora é sobretudo um ato de muito amor!