Visitas da Dy

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Ar-Dor



Seguem as horas.
Seguem os grãos de poeira a dançar no ar.
Tudo é novo. Nada me encanta. Tampouco tenho vontade de explorar: seja esse quarto de hotel, seja a cidade lá embaixo, ainda quieta, ainda fria.
Dentro de mim, ainda está tudo meio morno. Ainda alimento dúvidas. Agora penso em acender um cigarro, pegar uma bebida ou dar um cochilo enquanto a cidade não começa seus gritos ensurdecedores e insistentes que não me deixarão descansar.
Deito. Não durmo. Rolo. Não caio. Nessa cama que acolhe meu corpo, despejo meu mundo e pouco caibo nele ou ele em mim. Somos uma simbiose, mas não há pleno acordo entre nós.
Começo a arder.
Há no ar uma dor.
Há um ardor.
Respiro esse bafo quente e úmido, coisa de litoral.
Da janela avisto uma praia que desconheço, como todo o resto da paisagem lá fora.
O dia está cinza e caberia em um cinzeiro. É um dia daqueles que amanhece pálido e com uma aparência adoentada. Faltam-lhe alegrias. Falta-me algo. Somos dois incompletos: o dia e eu.
Parece-me que essa paisagem e esse dia desconhecem a finitude. Pousam na linha da eternidade. Estou ardendo. Estou em estado de quase febre: ardo essa eternidade. Sinto o peso de ter vivido séculos, como se tivesse protagonizado cada uma das histórias que li, cada uma das histórias que escrevi.
Não caibo mais na cama e muito menos em mim. Não refresco meu estado febril nem as ideias ou a cabeça. Sou brasa. O mundo, meu braseiro. Sigo ardendo e quase tudo não me basta. Toco as cinzas do dia com a ponta dos dedos e renasço: sou uma espécie de fênix, que só sabe o que é a vida quando arde.

Tateio o desejo de frescor e incendeio: desconhece o morno quem nasceu pra ser fogueira.

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