Cheguei cansada dos trabalhos feitos no dia. Talvez mais cansada
que o de costume. Heranças de noites passadas e mal dormidas.
No meu rosto, uma expressão cansada, pesada, quase desaminada se
completava com um bocejo enorme, daqueles que não se pode conter.
"Tem um postal pra você, mocinha!" falou entre um
sorriso o meu porteiro, sempre bem humorado.
"Jura?!" Eu duvidava. Esperei ansiosamente pelo papel,
que eu já sabia vir de algum canto da França, já que nunca sei os nomes dos
lugares e as suas regiões geográficas - besteiras pra quem é historiadora e
lida com nomes, datas, lugares e regiões o tempo todo.
Meu postal era lindo, é lindo! Ville de Sete, é o porto que está
estampado, com uma embarcação bem colorida, onde se acredita, segundo o meu
remetente, ter sido o ponto de partida dos cruzados.
Fechei os olhos, segurei firme meu cartão ainda no elevador e
senti o cheiro de sal, gosto de mar na boca, que se sente quando se está num
porto. Dei um pulinho ali no velho mundo, subi na embarcação colorida, com o
mesmo nome da cidade, saudei meu remetente, que mais que um postal, naquela
noite me forneceu um passaporte para navegar no Mediterrâneo, entrei em casa,
meti-me nos pijamas e fui para a cama, às sete da noite - qualquer semelhança
com o nome do porto é coisa da cabeça de quem está lendo - e dormi tranquila,
como se estivesse, de fato, naquela embarcação, sendo embalada pelas ondas
mediterrâneas.
As coisas simples da vida, como receber um postal, realmente me
fazem compreender que a felicidade é um amarrado de momentos singelos, que
encontramos por aí, com Guimarães Rosa, nas horinhas de descuido.
*** Para o Matias, que me deu uma enorme alegria com um simples postal! ***
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