E lá vem o
Natal. Mais uma vez. Mais do que uma data religiosa que nem sei bem se acredito
com a fé que duvido ter, abalada pela ciência que escolhi ter como companhia
diante dos livros, o Natal é para mim um tempo de tumultos.
Tumultos nas
ruas, onde as pessoas correm aflitas para gastar o tão sonhado décimo terceiro
salário. Tumulto nas vésperas das festas para se chegar em casa a tempo de
participar da ceia, de dar um abraço na família, de não perder essa data tão
especial.
Corremos o ano
inteiro esperando o Natal. É um momento no qual todos acreditam renovar as suas
esperanças e eu já não sei se renovo as minhas. Não sei se consigo ter fé em
pessoas que esperam uma data especial do ano para se dizerem melhores, ou pelo
menos tentarem ser melhores.
O Natal
desenha-se para mim e meus olhos ora curiosos, ora observados, ora
completamente dispersos como se fosse um passe de mágicas: pedir perdão, dar um
abraço, desejar boas festas, distribuir sorrisos e os presentes. Isso sem
contar a comilança.
Não acredito
nos passes de mágica. Desculpem-me os mais ingênuos, mas passados alguns anos
vivendo essa data os comportamentos sociais já não me satisfazem. Já não dão
conta de me deixar esperançosa com o mundo e com o rumo que ele está tomando.
Não posso crer
em pessoas que passam o ano todo se ignorando e que se reservam abraços apenas
no Natal.
Não posso
levar em conta uma sociedade que se explora por 364 dias no ano, que tenta dar
o famoso “jeitinho brasileiro” e que no Natal vem com promessas de um futuro
melhor.
Sequer posso
levar a sério pessoas que não se importam com horários e que correm para não
perder a ceia de Natal.
Por que um dia
só é tão especial? Por que a necessidade de se passar APENAS esse dia com seus
familiares? Não dá pra entender.
Passados dois
anos longe de minha família e de meus amigos de infância que importam tanto
para mim, tenho a consciência de que o meu Natal se faz todos os dias.
Relendo a
minha criação cristã católica recebida desde muito cedo, entendo que o Natal,
celebração do nascimento de Jesus é, sobretudo um momento de renovar as
esperanças de algo que temos certeza: de que a salvação veio. De que é possível
algo melhor, de um projeto que se concretizou com o nascimento do menino. É com
base nessa criação que eu afirmo que meu Natal é todos os dias que posso estar
com os que amo.
Penso agora
que a correria pela ceia deveria ser todos os dias: não há nada melhor que
aquele almoço em que a gente se senta na mesa e divide as colheradas do
arroz-com-feijão feito com tanto carinho pela matriarca. Não precisa ser
domingo. Nem precisa ser almoço. Basta ser a refeição sagrada com a família.
A distribuição
de abraços deveria ser um hábito diário. Como é gostoso ganhar abraços. E da-los?
É muito mais gostoso! Por que nos reservarmos esse prazer só para as datas
comemorativas? Não dá pra ser feliz só alguns dias do ano. Não combina com o
projeto de vida que desejamos!
Mais um Natal
está chegando. Para mim é mais um dia em que as pessoas se atabalhoam por nada,
ou melhor, por não saberem de nada: não percebem o correr de suas vidas e não
sabem aproveita-las como se deveriam.
Mais um Natal
se aproxima e mais uma vez eu vou vive-lo como e fosse um dia comum. Não porque
não tem alguma importância para mim, mas porque eu o vejo em cada um dos meus
dias. O milagre da vida não se faz uma vez por ano. Se faz uma vez a cada dia,
quando acordamos e vamos à luta.
Um feliz Natal
para quem é de Natal.
Uma feliz vida
para quem é de vida!