Tendo nascida um pouco mais forte de que a maioria em seu tempo, ela, de envergadura pequena, mas de muita presença de espírito, tinha pouco mais amigos que dedos nas mãos e um coração-terra com o qual travava diálogos truncados no espaço-tempo de longas madrugadas, deitada na cama, na penumbra.
Quis o destino que ela soubesse o que era o amor-par apenas por ouvir falar e que o cultivasse não da forma romântico-encantada dos contos, mas de modo saudoso, como quem já o experimentara, deixando-o quase de lado. Dedicava-se, por outro lado, aos amigos-sementes, que lhes floresciam no coração.
De certo, cansada da jardinagem diária, sentindo-se sozinha em uma noite outonal indagou seu coração:
- Então, coração, você que floresce amizades, que esbanja amor-fraternal, o que me diz dessa sensação de lonjuras que me vem a cada vez que me deito e olho para as solidões de meus caminhos?
- Ora, pequena jardineira, não sou eu a terra em que firmas suas sementes. Sou, nesse caso, de contrários: sou a semente dormente, cujo amor latente vem de longe no tempo, de passados. E, embora sofra de dias nublados, repara bem nos brotos que já me saltam quando certo sorriso-sol me aquece...
Cansada, adormeceu aconchegada entre aquelas palavras e, tão logo despertou, passou a observar os sóis que lhe faziam generosas carícias quentes com seus sorrisos até o momento que, de súbito, o rosto corou... a pele ardeu, o peito parecia romper-se e o coração, aos pulos, lá no fundo gritava:
- Dê boas vindas à primavera da vida: floresci! Sou oásis em seu peito que era deserto... Estenda a mão e colha o seu amor-par.
Ainda desnorteada estendeu a mão e ouviu a música do universo tocando para que, entre levezas, com seu par, deixasse de ser jardineira e se tornasse bailarina.
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