segunda-feira, 24 de junho de 2013
O que a boca não diz
Há muito estabeleceram uma relação de confiança entre si. Eram dedicados, alguns diziam até devotados. Havia um ar de cumplicidade entre eles que chegava a incomodar quem os rodeava e não entendia muito o que se passava.
Pautavam-se muitos de seus momentos no silêncio. Não precisavam mais usar as palavras. O silêncio de cada um deles dizia muito e mais, coisas que a boca simplesmente não conseguia exprimir: ou porque não conhecia as palavras ou porque gostavam de deliciar-se com as palavras silenciadas como quem degusta um manjar divino.
No silêncio que às vezes, faziam conseguiam entender melhor a si mesmos. Era como uma experiência de reconhecimento. Acreditavam que ficar em silêncio com o outro era um momento mais mágico, mais especial do que quando as palavras saiam desenfreadas, soltas, sem sentido, atordoantes.
Era um silêncio aconchegante, acolhedor, envolvente. Era a prova de que as pessoas podem ir mais e além quando encontram quem as entende, assim, sem que fossem necessárias verborragias.
Conseguiam, em silêncio, contemplar o vento bater nas folhas, uma obra de arte de séculos passados, uma música mais harmoniosa. Com o tempo, achavam que o silêncio poderia ser melhor do que qualquer palavra e passaram a reparar um no silêncio do outro, decifrando tudo o que a boca dizia quando calada.
Era possível entender as lágrimas de um sufocadas num soluço noturno sem que uma palavra fosse dita. Era possível ver a grandeza do mundo e a pobreza das tantas palavras que conheciam diante da falta de sutilezas para expressar todo o sentimento.
Com o passar do tempo, aprenderam a jogar esse jogo de conhecimento e desconhecimento que era marcado por suas palavras, mas em muito, pelos seus silêncios. Perdiam-se neles. Perdiam-se em uma aura de amor, cumplicidade e companheirismo que dispensava as palavras, porque ninguém jamais entenderia. Porque, por vontade própria, diante de tal relação, até as palavras escolheram se calar, amando-se num cochicho, num sussurro até chegarem no silêncio pleno, completo de coisas que a boca não dizia.
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