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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Fugitiva


Para ler ouvindo Eric Satie - Five Nocturne




Sou uma fugitiva, confesso!
Fujo de tudo o que me causa apatia.
Fujo dos caminhos que podem me levar ao desconhecido, àquilo que não tenho controle. Uns dizem que fujo do destino e suas linhas tortas. Eu digo que fujo do incerto.
Não sei lidar com o que me escapa: meu flerte é com a razão. Que me importa se o mais importante é o que fala ao coração? Ele é um tolo! Quando resolvo ouvi-lo, sofro! Ele é muito aberto, se doa, se rasga, se marca e não quero carregar essas mesmas marcas.
Nasci para questionar. Uso as palavras como minhas armas, minha liberdade e minha prisão. Por elas me expresso, com elas me escondo. Trafego em linhas escritas por um lápis preto num guardanapo de um bistrô qualquer, manchado pela última gota de café que morreu nos lábios. Envolvo-me em versos aveludados, que escondem segredos. Escorrego-me entre sedas brilhantes, que não se deixam prender, assim como a seda, minhas palavras – e eu mesma – podem ser escorregadias.
Por trás das lentes de meus óculos analiso, questiono. Observo cada milímetro com muita atenção ou com nenhuma. Chamar minha atenção é fácil, prende-la é que é o grande desafio. Busco, incessantemente respostas, porquês e justificativas.
Nada se explica por si só. Nada acontece por acaso. Esse é só mais um caso desses contados para nos entreter, para nos livrar da mea culpa que nos cabe quando preferimos apenas aceitar o que nos acontece. Desejamos dias melhores, vidas melhores, sentimentos lisos e fortes, mas não ousamos conquistá-los. Não ousamos questionar o por quê da demora ou classificamos tudo como sorte. Conformados, conformistas. Patéticos.
Será muito difícil compreendermos que nada se explica pelo simples fato de ser? Tudo tem o seu motivo, a sua razão, e busca-la além de ser um desafio é um combustível para nossas vidas: arregaçar as mangas pode ser uma tarefa que incomoda, mas nos prepara para novas aventuras, novas respostas nos dão novas luzes, abre nossos olhos. Respiramos um ar mais puro quando encontramos as respostas que buscamos e nos sentimos aliviados quando chegamos na culminância de nossas lutas diárias, coroadas com a vitória. Questionar e obter a resposta é beber do néctar dos deuses, é sentir-se quase um semideus.
É preciso que ser ousada. É por isso que fujo dessa monotonia, porque ouso sair da zona de conforto que os dias de pasmaceira me trazem. Gosto de me posicionar nos extremos, como se os binômios paradoxais fossem perfeitos e convivessem em harmonia em minha personalidade. Comigo é sempre na base do tudo ou nada, oito ou oitenta, ame ou odeie. Em minha escala de sentimentos coloco-me sempre na melhor das opções e quem perde não é quem opta pela distância, pelo meu nada, mas quem se desgasta tentando ficar no meio, tentando achar um equilíbrio que não existe.
Gosto da corda bamba das decisões. Escolher entre um caminho e outro me consome tempo, me invade as noites e causa insônia, mas a certeza de fazer a escolha é minha busca constante e gosto do desafio de me equilibrar lá nessa louca corda bamba sem rede e sem caminho de volta que é a vida.
Não acredito nas coincidências. É fazer pouco caso demais da vida. Acredito em circunstâncias que nos levam a tomar algumas ações seja porque somos experientes, seja porque não somos. Essa coisa de destino é um pouco alheia para mim. Não adianta ficar no sofá que os nós não vão se desfazer sozinhos. Meus livros não entrarão por osmose em minha cabeça, o dinheiro não vai multiplicar seus dígitos em minha conta bancária. O destino pode existir, mas ele depende em grande parte da minha ação para se concretizar, bem ao estilo do poeta, pois é caminhando que se faz o caminho.
Sou uma fugitiva confessa! Ando fugindo das peças que o tal destino – se é que existe – pode me pregar. Ando fugindo de todo o descontrole que sinto ao ser pega de surpresa. Estou fugindo de quaisquer pares de olhos que se ponham a me observar de perto e fujo de quem não se deixa observar pelos meus olhos de cedro, arcas sagradas guardiãs de meus segredos. Os meus olhos foram feitos para olhar, para descobrir, desvendar e se tentam desvenda-los me desfaço em timidez, porque quando o véu que os cobre cai, o que se vê não é o castanho de minhas íris, mas as profundezas de meu ser, o meu mundo que eu chamo coração.


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