Ao esforço da
literatura recaem meus lamentos e amores. Não os sonho muito mais do que um
piscar de olhos e um “só por hoje”. Aprendi que essa, quiçá, seja a breve
fórmula da felicidade: viver o hoje.
É um
exercício, de fato, que as horas não sejam contadas a longo prazo, apenas como
brevidades. Ora, vistas de olhos bem fechados, despertando sensações. Ora,
sonhadas de olhos bem abertos, atentos aos milagres da existência.
Aprendi que a
descrição, via poesia, torna tudo mais leve, mais completo. O viço de seu
sorriso só perde para o frescor de sua chegada. Assim como beber o castanho de
seus olhos me desperta bem mais do que qualquer café que eu coloque na xícara.
Não se tratam
de loucuras ou delírios febris. São apenas as formas poéticas de descrição
daquilo que coleciono nos dias: meus sonhos e quereres.
De certo,
faltam-me palavras às vezes. Faltam-me línguas escorregando por troncos
diferentes, em sentidos mais amplos do que posso compreender, para (d)escrever as sutilezas que me saltam ao
coração.
Percebo-me,
então, na condição eterna de aprendiz: por vezes alegre com as conquistas, mas
infeliz alma que nunca se sacia, porque o que se almeja nunca chegará à
completude.
Oh, sísifo
esforço! Nenhuma medieval dedicação lhe será suficiente aos sentidos tão seus e
próprios dos desejos que brotam à alma. Não há descanso nem durante as longas
noites em que mergulha nos véus de Salomé (se é que essa um dia os ostentou).
Não se
revelarão os segredos mais tolos, porque deles é o reino da imaginação, onde,
além de suas nuances, habitam os léxicos tantos que só arrisco na borda
transparente que contorna um sumo tinto e inebriante.
Não se
responderão minhas perguntas filosóficas, minhas expectativas ou conjecturas dignas
de uma Babel, porque não se traduz o que se sente senão por exageros e lirismo
e, uma vez tocado por esse encantamento, não poderão se descolorir em
realidade.
Contento-me no
esforço diário da escrita: cartas, versos, poesia e entrelinhas que, para além
de uma organização de palavras, são, sobretudo, uma tentativa de compreensão do
mundo e de sua existência longe da minha.