Já havia se acostumado com o frio das tardes outonais. Sentia esse frio
mesmo se fosse verão. Sentia-se vazio mesmo quando estava cheio. Sentia-se
sozinho mesmo quando acompanhado.
Sentia a falta daquela que por algum tempo havia se transformado em todo
o seu tempo. Em todos os seus pensamentos. Agora já não sabia mais caminhar
pelos mesmos lugares de antes sem sentir a sua presença naquela ausência.
Tudo tinha sido muito rápido, quase um piscar de olhos. Uma mudança de
estação. Tempo contado no relógio. Prazo de validade curto. E ela não lhe saia
da memória...
Enquanto olhava para a paisagem com árvores desfalecendo e perdendo as
suas folhas, típico da estação, pensava nela. Em como ela vinha sempre leve,
sorridente. Era uma calma em forma de agitação. Vê-la se mover entre todos e
ocupando todos os espaços cansava os olhos que precisavam busca-la
incessantemente, mas enchia o ar com uma alegria imensurável. Como poderia uma
pessoa como outra qualquer ocupar todos os espaços que o rodeava e fazer tanta
falta? Como poderia ela ser tão presente mesmo em sua ausência?
Aquele vento frio o fez lembrar de um dia em que ela cogitou não sorrir
e ele a repreendeu terminantemente. O sorriso dela era impagável. Era combustível.
Era um renovo de caminhada, de planos e de esperança. Ele precisava dela. Precisava
do sorriso, quase como um pássaro é dependente do céu.
O som do vento fazia com que ele se lembrasse dela sussurrando uma
canção em uma língua desconhecida. Ela adorava cantar mesmo que não soubesse as
palavras. Ela dizia que sentia a música, a melodia, independente das palavras. Classificava
as músicas pelas sensações que sentia e quase nunca pelo ritmo. Para ela, a
música preferida era o tum-tum: aquele que se ouve toda vez que encosta a
cabeça no peito do amado. O coração sabe fazer declaração de amor silenciosa. Ele
não erra nas palavras.
Por um momento ele desejou chorar de saudade, mas estava estagnado em
suas emoções. A paisagem o levava para longe, para minutos passados que
poderiam ter durado uma eternidade. A claridade do dia iluminava a sua solidão.
Ele desejava ouvi-la. Sabia que nesse momento, por algum motivo, ela falava com
todos, menos com ele. E aquele silêncio enchia toda a sua alma. Ela falava
mesmo em silêncio. Ela era presente, mesmo passado.
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