Visitas da Dy

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Resiliência





Quando toda a palavra for pouca,
Não brigue, não esperneie:
Assuma o silêncio como seu.
Assuma sua cria como puder.
Não há de faltar lugar para os vãos que criou.
Nem sempre haverá solução,
Nem sempre caberá essa ou aquela definição.
Então, menina, aceita a falta de som.
Aceita o que a boca não sabe falar.
Aceita que no fim do dia a noite cairá
E nem sempre haverá olhos que lhe guiarão,
Nem sempre a lua vai chegar,
Nem sempre as suas histórias serão lidas
Muito menos verdadeiras
E nem os finais têm obrigações fieis de serem felizes.
Para cada texto, um pretexto,
Uma palavra-chave, um contexto.
Para toda frase uma pontuação:
Ainda que seja a final,
Ainda que não acerte a entonação.
Aceita, menina, que o papel é seu.
Aceita que lhe cabe escrever e não ler.
Aceita que cada um entende o que pode
E faz das tripas uma lira
Só aquele que sabe fazer das palavras, canção.
Aceita, menina, que o sono vem
No descanso ou no desespero
E que os olhos se fecham assim como as portas
E que se abrem assim como os sonhos.
Aceita que faz parte da festa o presente que não veio.
Que o brigadeiro acaba,
Que o balão estoura,
Que os convidados irão embora.
Aceita que a folia é de reis,
Mas que a alegria verdadeira é do bobo-alegre
Que ria despretensioso ao meio-dia,
À meia-luz, à meia-estação
E que não perde o bonde quem chega atrasado,
Mas quem se recusa a correr atrás.
Aceita, menina, que tem pernas pra andar
Mas que as suas asas nunca foram podadas.
Aceita as cortinas caem, que o teatro lota ou fecha,
Mas que o ator tem que estar lá.
Aceita que nada pode quem se entrega,
Mas só vive bem quem se entrega.
E se a entrega carrega em si a negação e a felicidade,
Faz dessa palavra o seu verbo preferido,
Faz dessa palavra o seu lema, o seu tema, o seu plano.
Faz do seu silêncio o seu guia,
Mas não forje com ele os seus grilhões.
Faz do seu medo a sua expectativa,
Mas não se poupe o salto no abismo.
Às vezes o desconhecido é tudo o que se precisa
Para chegar onde se queria.

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