Visitas da Dy

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Pen(s)ar


A cabeça girava mais que um girassol nas tardes alaranjadas de verão. Os seus sóis eram as ideias. Preferia o silêncio turbulento de suas reflexões às tagarelices intermináveis e vazias.
Fazia do ato de pensar o seu esporte. Passava horas em lugares distantes, por mais plantada que estivesse no chão. Chegava a fazer parte da paisagem de tão comprometida com suas elucubrações. As noites eram combustíveis para suas ideias febris e sedentas de respostas e elos perdidos.
Ao longo de tantas madrugadas o pensar já se havia transformado em atividade terrível: tirava-lhe o sossego, o sono, a calmaria e conduzia a passos lentos, mas contínuos ao cansaço.
Pouco a pouco o gosto pela solidão aumentava, assim como o apreço por certa ponta de tristeza e desapontamento observados pelas janelas abertas de suas reflexões. Chegava a ser movida pela vontade de não pensar, de poupar-se à tarefa que lhe desgastava pelas madrugadas sem fim.
Imersa em si mesma já sentia um penar no ato de pensar. Muito maior, é verdade, se era chamada a expor-se. Não sabia mais em que medida deveria manter seus pensamentos soltos. Prendê-los e não mais pensar seria uma saída, mas, sobre isso, era preciso pensar.
Estava feito: estava condenada a si mesma, círculo vicioso do pensar (até em não pensar), de repensar e de se alterar, fluida como as próprias ideias, leves e confusas, emaranhadas e dispersas, vigorosas e tênues, possíveis ou insanas.

Pensava. Voava. Abria-se em si mesma e se recolhia com as asas maiores, capazes de voos longos e cada vez mais perto do sol: sabia que não cairia, suas asas não eram com as de Ícaro, mas como as de Ísis, que humildemente sempre se lembrava de todos os começos.

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