Meu mundo são quatro paredes, pelas quais desenhei
cometas e estrelas cadentes, pelas quais escrevi bilhetes e poemas. Pelas quais
pendurei molduras vazias, buscando um rosto diferente de cada vez.
Minhas quatro paredes... eis aí a definição de
mundo. Nada de grandes espaços, uma fronteira para o mundo, porta sem chave,
para quem quiser ficar, entrar, uma janela para o infinito, para que os versos
criem asas e as músicas pousem na soleira.
Eu que não gosto da primavera, hoje recebo flores e
pássaros para o café da manhã. Recebo luzes ofuscantes e quentes e vivas e
alegres, como aquilo que me move nesse momento. Toco cintilâncias contentes
quando me espreguiço nesse domingo.
Eu que pouco me arrisco para fora desse quarto, que
o chamo de mundo, que o decoro com toques do mundo: corujas, elefantes,
arabescos de mil e uma noites e cores de van Gogh, tudo se harmoniza nesse
mundo que eu criei e que, às vezes está aberto à visitação. Hoje, talvez.
Eu que carrego um colar de prata, um símbolo da
chama inquieta que sou, também cedo às pedras da Lua e aos olhos de tigre. Retiro
deles energias e aprendizados: a rigidez não exclui a beleza.
Eu que sou de outonos e invernos, pintei paredes ensolaradas
no meu mundo: gosto dos contornos luminosos das tardes findando. Gosto dos
alaranjados esperançosos de sabores noturnos que não se podem conter.
Eu que gosto de cores e sons, de entrelinhas e
manhas, serpenteio pela casa como a bailarina se move na música, com certa
leveza e confiança: conheço meu espaço, conheço meu mundo.
Eu que flerto com as tristezas alheias, hoje serei
só novidades, serei mais amplitude, serei mais amor que posso ser: entram
flores e borboletas pela minha janela. Contaminaram-me com suas asas. Agora só
desejo voar pelo dia que me invade, mas pousar, com calma, mais tarde, nesse
meu mundo, nas quatro paredes que me cercam e me guardam preciosa.