Tantas sou,
que diante do espelho é preciso escolher quem serei ao longo do dia.
Não se tratam
de máscaras, mas de marcas que fazem parte de quem sou agora e de tudo o que
sinto.
(Antes de
qualquer coisa, trata-se das cicatrizes que vou expor por aí.)
Por vezes,
sinto tanto e em profundidades tamanhas que não me reconheço, não caibo nem no
reflexo nem na ideia que faço de mim mesma.
Há um quê de
loucura? Eu prefiro chamar de excesso de lucidez que tenho para comigo e para o
mundo que vejo. E ela me extravia de quem fui, afastando-me do que foi frio ou
morno, levando-me a passos largos e firmes para tudo o que me faz febril.
Gosto quando
as faces estão rubras. Gosto da sensação do sangue pulsando e correndo pelas
veias. Gosto de ter os lábios quentes com a empolgação do desconhecido.
Não nego que
muitas vezes a boca fica seca. O ar parece queimar. As palavras teimam em
derreter na ponta da língua e voltam para dentro da boca. As ideias não saem. O
sentimento não se dissipa no ar, não se mostra. As pernas desejam avançar, mas
o querer ainda é pouco e elas estacam. É, então, como uma força oculta que me
guia e me derrama sensações que desconheço e que recebo resiliente.
Diante do
espelho, enquanto essas sensações, resultados de experimentações, desfilam
diante de meus olhos e me impõem a escolha de um “eu”, consigo refletir e
questiono-me se, de fato, sinto isso tudo ou se são delírios.
A voz que me
responde é interior e clara: o poeta sente mesmo quando não o sabe e traduz o
intangível em palavras. Toma a sua caneta. Rabisca o seu papel. E qualquer que seja
o “eu” que escolher, escreva. Porque só se é e só se sente verdadeiramente
quando o abandono do lugar comum acontece. Escreve. E sai, assim, do lugar
cativo. Alça voos que seus olhos sonham e será plena de uma beleza
imensuravelmente contagiante. Será poeta. Será verso.
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