A moura nascera diferente. O sol não lhe
queimara a pele. Ao contrário, a lua a deixara láctea, com olhos de imensidão e
desejos cadentes por estrelas.
Em noites frias que cobriam os seus próprios desertos,
ela serenava como um rio sob a lua crescente e cheia de si permitia que seu
olhar vagasse pelos jardins de seus oásis.
Em dias quentes bebia das fontes frescas de
palavras que o vento lhe trazia em caravanas e mais caravanas de terras
distantes. Cada um dos versos lhe soava como velhos conhecidos, linhas
emaranhadas de caminhos percorridos por pés que nunca se cansavam.
Não era como os outros que conhecia. Não se
contentava com os contos fabulosos de terras vizinhas. Fazia ela mesma suas
histórias. Tecia, ela mesma, suas lendas, suas fábulas, seus contos e pagava a
conta: o alto preço por ser ela e tantas outras ao mesmo tempo.
Dava-se ao luxo de acordar diferente todos os
dias. Oscilava entre ser princesa, beduína, caravaneira, odalisca. Dispensava o
ouro, pois brilhava com o sol; despia-se da seda, já que a pele reluzia com a
lua; rasgava seus véus e emoldurava-se com seus cabelos.
Gostava de sentir-se livre. Gostava da sensação
de ser uma ave-do-paraíso. Gostava de abrir os braços e sentir o vento enquanto
dançava ao som de harpas. Por se sentir diferente, criava asas desejando
alcançar as estrelas. Por não caber-se em si mesma, extravasava ao som da
música.
A moura não tinha os cabelos negros como a
noite e de Láyla, só o nome lhe coubera. A moura delicada como pétalas, pisava
flores quando dançava e perfumava-se de rosas, embriagando o vento. A moura,
leve, etérea, perdia-se na noite e na chama acesa que a iluminava nas
madrugadas nas quais ela ousava ser mais ela do que poderia.
A moura de olhos de imensidão fitava o além das
estrelas, buscando o sentido de sua vida, buscando o fio do destino, buscando
os rumos de seus passos. A moura que escrevia as próprias histórias olhava para
o céu infinito e mesmo sem compreender a razão de seus dias, tinha uma certeza:
tudo aquilo já estava escrito. Maktub!
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