Visitas da Dy

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Parindo Estrelas






Por vezes, escrever é a única coisa que me acalma, me liberta, me salva. Diante de uma folha em branco, com a caneta na mão, posso povoar aquele universo inteiro com sentimentos, como se eu fosse o céu e estivesse parindo estrelas que, por vocação, servirão de alento, esperança, conforto. As palavras saem de mim. Eu me abandono em cada uma delas e passo a habitar entre margens como uma singela forma de estar em vários lugares ao mesmo tempo: moro em cada um de meus escritos, onde quer que eles estejam. Nasci poesia. Sinto demais. Escrevo demais. É o esvaziar-me que me dá vida. É a palavra que me salva e, por ser eu mesma quem a (re)cria, sinto-me tão sagrada quanto ela: coexistência divina. Sou verbo. Ação. 

domingo, 28 de abril de 2019

Da despedida de um amigo



Eu ainda não sei bem se meu café com cardamomo vai ser o mesmo amanhã. Se quando eu dançar um dabke, terei a mesma alegria que tive antes. Eu nem sei bem em quanto tempo vou conseguir lidar com a saudade.
Despedir de um amigo sempre foi algo que me assustou. Não sei lidar com perdas: de jogo de botão a adeuses longos. E hoje foi dia de adeus.
Hoje foi dia de refletir a brevidade, de colher lágrimas em abraços benfazejos, de repensar a dança, a vida, sentir dor e alegria ao mesmo tempo: aquele que se vai cumpriu sua missão. É uma felicidade chegar ao fim do trajeto e ser sinônimo de boas lembranças! Mas, sou egoísta, e me dói saber que amanhã beberei sua ausência.
Hoje eu queria um afago na alma, um cafuné em cada um que chorou comigo.
Hoje eu queria só amor, ser um vento calmo, mas fui lágrima e sal.
Hoje aprendi mais uma coisa com meu amigo: o sonho vale a pena e precisa ser continuado através de quem fica. Agora, todas as vezes que eu dançar, será por sua memória.
Agora que não está aqui  e não me incentiva, me inspira. E será por sua lembrança que meus pés encontrarão os palcos.
Ao querido amigo, Tufic Nabak, que hoje é muito mais luz do que já havia sido em vida.

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Habitação





Habita em mim uma deusa,
Um sonho, seu som ancestral.
Habita em mim uma força,
Um lamento, um grito silencioso.
Habitam em mim gestos coloridos,
Traduções de meu eu em movimento.
Não sou mais que um eco rouco.
Não sou mais que a prece fervorosa.
Não sou mais que o milagre da vida,
Sua necessidade, seu colo,
Seu respiro, seu alimento.
Sou a fértil margem do rio,
O calor do sol e a força da lua.
Sou o que lhe cabe nas mãos e escapa:
Sou o tempo dançando na imensidão.
Não me descobri no mundo...
Foi o tempo que se encarregou de me encaixar.
Lugar nenhum me cabia,
Mas o ritmo, a dança, me cadenciam
Sou levezas, um pouco de cada deusa,
Transformo-me em sutil poesia.
Ganho asas, pássaro sagrado, 
Pousado nas margens do passado,
Dançando no meu mundo-presente
Sou, antes de tudo, faísca.
Sou parte da criação divina.
Danço o som do universo.
Habitamos o mesmo ritmo.

domingo, 21 de abril de 2019

Bailarina



Tendo nascida um pouco mais forte de que a maioria em seu tempo, ela, de envergadura pequena, mas de muita presença de espírito, tinha pouco mais amigos que dedos nas mãos e um coração-terra com o qual travava diálogos truncados no espaço-tempo de longas madrugadas, deitada na cama, na penumbra.
Quis o destino que ela soubesse o que era o amor-par apenas por ouvir falar e que o cultivasse não da forma romântico-encantada dos contos, mas de modo saudoso, como quem já o experimentara, deixando-o quase de lado. Dedicava-se, por outro lado, aos amigos-sementes, que lhes floresciam no coração.
De certo, cansada da jardinagem diária, sentindo-se sozinha em uma noite outonal indagou seu coração:
- Então, coração, você que floresce amizades, que esbanja amor-fraternal, o que me diz dessa sensação de lonjuras que me vem a cada vez que me deito e olho para as solidões de meus caminhos?
- Ora, pequena jardineira, não sou eu a terra em que firmas suas sementes. Sou, nesse caso, de contrários: sou a semente dormente, cujo amor latente vem de longe no tempo, de passados. E, embora sofra de dias nublados, repara bem nos brotos que já me saltam quando certo sorriso-sol me aquece...
Cansada, adormeceu aconchegada entre aquelas palavras e, tão logo despertou, passou a observar os sóis que lhe faziam generosas carícias quentes com seus sorrisos até o momento que, de súbito, o rosto corou... a pele ardeu, o peito parecia romper-se e o coração, aos pulos, lá no fundo gritava:
- Dê boas vindas à primavera da vida: floresci! Sou oásis em seu peito que era deserto... Estenda a mão e colha o seu amor-par.
Ainda desnorteada estendeu a mão e ouviu a música do universo tocando para que, entre levezas, com seu par, deixasse de ser jardineira e se tornasse bailarina.

sábado, 20 de abril de 2019

Janela



Toma conta de mim. 
Cede seu (a)braço um pouquinho.
Mesmo nas horas que eu pareço forte. 
Às vezes, preciso fugir de mim. 
Seja meu abrigo. 
Eu pareço dar conta de tudo, 
Mas tem uma hora que estanco. Sofro. 
Choro. 
Quero colo. 
Careço de sorriso, 
Seu carinho em meus olhos, 
Minha paisagem favorita. 
Às vezes, quero me abrir feito janela: 
E ver você debruçado em minhas margens.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Tatos



Pouco sei dizer do teatro da vida, mas me lembro bem daquela aparição no palco de minhas histórias.
Tinha uma iluminação que transpassava minha inspiração de recém-poeta, que aclarava os sentidos ao mesmo tempo me levava para outro lugar que era completamente alheio ao que já conhecia.
Era uma iluminação sagrada da qual tornei-me alma devota, entregue ao encantamento, ao desalinho de um não-sei-o-que-fazer, de um saber que, daquele momento em diante, eu deveria ser espera.
Aceitei o espetáculo ingênuo e singelo que o amor apresentava como quem não tem outra alternativa a não ser beber da eterna confusão dos corações que pairam entre a ilusão e realidade. Agora, aprendi a lidar com a luz que ofusca meus olhos: ela ensina-me o tato. E, enquanto anseio pelo toque, tateio sentimentos e sou expansões de compreensão, cuidado e sonho.

quarta-feira, 17 de abril de 2019

Espera em Movimento



A mulher que lhe ama, hoje, saiu atrasada de uma cama que mal reconhecia. Sacudiu os cabelos molhados, recolheu a roupa do chão e não deixou bilhete de bom dia. Não vai ligar pra ele. Nem sabe se atenderá a ligação que ele fará.
Ela pairou ali, naquele lençol por diversão, por vontade, porque nenhuma espera precisa ser estática.
A mulher que ama você foge às suas regras: pede uma cerveja, ri alto e serve no jantar uma comida congelada. Ela tem as próprias rédeas e raramente as usa.
A mulher que ama você poderia mudar o mundo, poderia correr até você, poderia por-se aos seus pés, mas, ao contrário ela o faz enxergar o mundo como um turbilhão. Ela o faz correr pelas ruas sem pouca direção. Ela lhe dá pés para a caminhada e sabe que as histórias serão longas. É por isso que ela lhe espera chegar. Mas a espera dela é agitada. É fuga da monotonia. É fuga da saudade que ela tem dos dias que ainda não vieram.
A mulher que lhe ama diz seu nome ao vento enquanto ouve sua música favorita. Ela o enxerga nos detalhes que têm seus traços, seu cheiro, suas cores. E ela o espera, mas nunca vai parar por você, porque ela é movimento.

terça-feira, 16 de abril de 2019

Ferida



Não, eu não quero lhe ver
Depois de ter-lhe sonhado a noite inteira.
Não quero relembrar o cheiro
Que ainda estava no travesseiro.
Não vou atender as ligações,
Quebrar o silêncio, 
Embriagar-me com sua voz.
Hoje não responderei ao bilhete entregue a outrem
Quando poderia te-lo deixado sobre minha mesa.
Não, eu não vou dizer uma só palavra
Vou guardar a saudade que é só minha
Esconder a euforia que sinto ao vê-lo.
Vou esconde-lo de mim, em minhas entranhas.
Vou apaga-lo dos meus dias.
Vou libertar-me percebendo sua ida
Vou lamber minhas feridas
E vou renascer