Visitas da Dy

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Mosaico

 Hoje ganhei um poema de presente do escritor Lionel Mota. Em gratidão e carinho,  a fim de não me esquecer desse mimo e de poder revisitá-lo sempre, eis o poema:




(Lionel Mota)
                     
Partido, quebrado
Esmigalhado coração
Reduzido a cacos
Alguns grandes, outros pequenos
Mais alguns, quase pó

Quebrado, partido
Resolveu reconstrução
Catar os nacos
Pedacitos de tanta história
Refazer-se por si só

Dessa junção de remendos
Caquinhos, cacos, aleijões
Foi-se fazendo mosaico
Contando histórias, perdições
Virou vitral, virou arte
E ninguém mais sabe
Qual parte ainda dói
Nesse coração


Alcance



Tenho tudo ao alcance das mãos,
Mas o que mais valorizo
Sequer posso tocar,
Sequer posso guardar.
Esse conjunto precioso de luminosidades
De seu olhar e seu sorriso
Com o qual me presenteia.

Sinto-me tocada em delicadeza.

Isso faz a vida valer a pena. 

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Luzes Apagadas



Apago as luzes, acendo os sonhos.
Quem dera eu pudesse escolher
As paisagens oníricas em que vou me perder.
Quem estará me aguardando
Quando nos braços de Morpheu eu cair?
Cerro os olhos e não sou mais dona de mim.
Afundo nos lençóis e sou amparada pelos sonhos
Suas mãos se estendem e as recebo
Como quem ganha um presente noturno.
Bailo ao som de músicas ancestrais
Tão aparentemente conhecidas quanto seus olhos de outono,
Olhos de folhas secas,
Que escondem tantas pistas quanto eu poderia descobrir.
Olhos de labirintos,
Nos quais me perco e não quero sair.
Há em mim sua nítida feição
E ela me acompanhará ao raiar do dia.
Esperarei por ela a cada amanhecer.
Ansiosamente em meu entardecer.
Certa de que se não me chega até a meia-noite
Adentrará solene em meus sonhos
Seja errante em meus desertos
Órfãos de versos,
Seja turbulento como os mares
Que cerceio com a palma das mãos,
Seja firme como as árvores das florestas
Nas quais me embrenho distraída.
Espero que me venha como a melhor das ideias
A melhor das sensações,
A mais bela estrela de todas as constelações
Que quase toco com a ponta dos dedos
Depois que apago as luzes no fim do dia
E lanço-me no único lugar em que, de fato,
Posso lhe encontrar.
Que me venham os sonhos,
Onde é real o meu amor,
Onde danço pequenina em suas mãos
Onde estamos ao nosso alcance
E não há dúvidas em que irei pensar
Quando de novo a luz se apagar.


terça-feira, 28 de abril de 2015

Superficialidades



Queria demais. Sonhava demais. Não se encaixava nas superficialidades diárias das pessoas e isso lhe esfriava a alma e lhe deixava exausta das tentativas de aquecer quem lhe rodeava com seus sorrisos. Estava aprendendo a desfazer-se. A não se importar. A abandonar-se. E o processo além de longo e solitário, era frio, era um chão de giz que ela só poderia atravessar por seus próprios pés. E tentava. Todas as manhãs.
Decidida, desfez-se de si mesma. Mais uma vez. Não sabia mais quantas tentativas havia feito só naquele mês, naquela semana.
Passarinho em época de muda.
Trocava suas dores lentamente por sorrisos. Aos poucos recoloriu tudo: as paredes da casa, as roupas, as unhas, o cabelo e a boca. Voltou a sorrir. Voltou a cantar.
Inventou novas histórias nos cadernos em branco que estavam ajuntando poeira em um canto da sala e tudo ficou bem como deveria ser. Café para começar o dia, manteiga manhosa derretendo no pão quente. Colher batendo na borda da xícara, a falta de paciência com o jornal.
Trilha sonora da década de 1970 no caminho para o trabalho. Desejos de um outono que durasse o ano inteiro. Caminhadas pelo centro da cidade tão descomprometidas com o horário quanto com os passos dados.
Aos poucos tudo entra nos eixos, tudo volta ao normal. O que era e havia deixado de ser se restabelece e tudo segue seu rumo. E as horas seguem. E o tempo voa. Parece muito mais veloz agora, mas o chá no meio da tarde acalma e dá a pausa necessária para um suspiro de fim de jornada, um suspiro de entrega aos descansos merecidos.
Parecia que tinha sido ontem, mas havia sido naquela manhã. E em todas as outras. Era igual todos os dias. Só que àquela hora, já não doía. Aprendera a lidar com a com como se fosse um parto á fórceps: quando algo natural precisa de um auxílio violento para se concretizar, mas sabe-se que tudo fica bem ao final. Não sabia lidar com as dores e todas elas lhe pareciam desnecessárias e feitas para um outro alguém que não ela.
Não aceitava as desordens que lhes eram causadas pelas transcorrências da vida, mas aprendeu a conviver com elas cotidianamente e agora não doía. Era só vazio. E nesse vazio, tentava semear algo de bom. Como se fossem vasinhos à espera de sementes de flores.

Com tantas mudanças, transformou os seus quereres e planos feitos papeis tão frágeis como se fossem areias à beira mar em simpatias e amabilidades sintéticas, mas sinceras, se é que isso é possível, e leva a vida à pratos rasos, quando, de fato, bem lá dentro, desejava pratos fundos de sentimento e atenção.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Quem Dera




Feliz de quem soletra o seu bom dia,
Acordando o sol,
Recebendo ora a deliciosa sensação de ser lembrado,
Ora a certeza de ter tocado estrelas.
Feliz quem colhe seus sorrisos,
Quem tece com eles histórias.
Feliz quem ouve as batidas de seu coração
E com elas cadencia os dias.


domingo, 26 de abril de 2015

Serenidade




Quando pus-me a caminhar pelo mundo,
Pés descalços, alma desarmada,
Não esperava tantos espinhos.
Acreditava nas flores que via,
Nos tantos perfumes que inebriam
E que emolduravam os amanheceres.
Meus olhos ardiam com as quenturas do verão,
Entristeciam-se nas friezas invernais,
Mas, tocados pelas delicadezas dos entremeios
Fossem outonos ou primaveras,
Coloriam-se e ganhavam vida.
Dos tantos laços que teci,
Alguns me prenderam, ásperos, de modo que sofri.
Outros tantos, de tão frouxos, igualmente doeram.
Curiosa sensação de dor:
Pelo aperto ou pela folga.
Os extremos doem.
As doçuras de açúcares nem sempre verdadeiros
Tanto adoçam quanto amargam.
Amarguei as realidades que engoli à pão seco,
Com solavancos, trancos e barrancos.
Com dores certas que me acertaram no alvo, no âmago,
Alma nua, crua e alvejada.
Alma crescente, tornando-se experiente
Tocada por esperanças renovadas de felicidade
Desfazendo-se dos vazios que preenchiam seus interiores,
Expulsando tudo o que não fosse alegria.
É cansativo desfazer-se de si mesma.
É construção lenta de pontes de sentimentos,
É um aprendizado constante de equilíbrio,
É lidar com repousos inquietos
E inquietudes que acalmam.
É saber-se pouco e tanto que se baste
É saber que não se basta só por querer
É aprender a esperar
E esperar para aprender
É ser contrários em si
E respeitar-se
É ser:

Serenidade.

sábado, 25 de abril de 2015

Palavras Indizíveis



Deixei um livro aberto
Bem em frente à minha janela.
O vento chegou sorrateiro,
Embaralhou as linhas paralelas,
Espalhou as palavras como borboletas,
Ideias aladas que ganharam o azul.
As palavras voaram e me pousaram sutis,
Voaram livres, me fizeram seu descanso.
Voaram tranquilas, me fizeram seu pousio.
Do jardim eu comia um pedaço de nuvem,
Açúcar que rodopiou no palito,
E encheu a boca com gosto de infância.
O vento deu em minha saia rodada,
Girou a cabeça de menina.
Trouxe ele inspiração pra poesia.
Trouxe um nome, um cheiro, uma rima.
Trouxe sentimentos que eu desconhecia.
Eram palavras mudas, indizíveis,
Eram sentimentos tênues, indivizíveis,
Eram gotas de felicidade que pariram um arco-íris
Eram melodias de bem-te-vi,
Mas não vi...
Porque o vento, só senti...
Agarrei-me às asas de borboleta-palavra,
Tingi o papel-asa com tinta-sorriso,
Organizei os versos e os recoloquei no livro.
Agora guardo as palavras
Longe das janelas:
Quero distância de todo pé de vento.
Lugar de memória é em baú de tesouro,
Lugar dos meus versos é travesseiro,
Perto dos sonhos, à altura dos olhos,
Embrulhados em fantasias pueris,
Versos sagrados no altar

Que construí no dia em aprendi a ouvir silêncios.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Teimosias




Era um sol teimoso
Que coloria o céu,
Que afastava de nós as horas
Nas quais nos desfizemos em nós,
Desatando nossas vontades,
Experimentando-nos,
Alimentando-nos boca a boca
Como quem ganha força para o novo dia.
Calma, que o sol que nos desperta
Também nos arde.
Calma, que o sol do meio-dia
Há de ser o mesmo que aqueceu nossos lençóis
À meia-noite, à meia-luz.
Calma, amado meu, que mesmo sob esse azul
Todo reflexo são dos olhos seus,
Todas as juras serão suas
E todo café-castanho irá me embriagar.
Calma, amado meu, e contempla o céu
Chamuscado de dourado
Ouve as preces do vento e crê:
Sou aquela que lhe espera no entardecer,
Com brasa nas mãos pra lhe acender,
Que faz da noite seu abrigo,

Do meu seio sua senda.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Perguntas e Respostas





Faço das respostas perguntas.
A cada pergunta, novas dúvidas
E o círculo vicioso se forma.
Se não sei nunca a resposta,
Se não me cessam as perguntas,
Não descanso nem de dia nem de noite.
Sou um questionário infinito
De matéria ainda não dada,
De manias ainda não decoradas
E se lanço no ar a dúvida corrosiva,
É que aqui dentro ela já deu partida:
O que não converto em poesia,
Retina pela minha retina,
Rebrilha em estrelas frias
E segue a badalar nos ouvidos:
Há perguntas sem respostas

Há compreensões que dispensam entendimentos.

domingo, 19 de abril de 2015

Tardes




Não tarde a chegar nesse fim de tarde em que a lua já desponta, em que o último cacho dourado do sol descansa à beira da janela onde coloquei meu vaso de flores.
Não tarde a ser o motivo do sorriso em minha boca, em colher o beijo que lhe reservei e que contenho mordendo os lábios encarnados com a cor viva de jardins inteiros, quente como o fim desse dia de verão.
Chegue e não tarde o instante dos olhares. Já está muito adiantado o andar das horas, dos dias, dos anos que contamos e das tantas experiências que ainda não partilhamos, mas estão à espera de nós, cintilando nos resquícios da luz que ainda suspira nesse fim de dia.
Estanque à minha frente e deixe-me dedilha-lo como se fosse um alaúde, como se não me restasse escolha a não ser fazer ressoar a canção que representa a minha vida, meus sonhos e meus prazeres. Cantarei a você meus versos iluminados pela chama das velas, companheiras dos ecos que minha boca chama: seu nome desconhecido.
Silencie os agouros que me foram atirados. Acanlante as preces que desfiei não em rosários, não em contas de lágrimas, mas nos sons longínquos de além mar, de além olhos, carregados com os cansaços de meu fardo que pesa mais quanto mais tarde fica.
Não tardemos mais o nós. Desfaçamo-nos dos nós e apreciemos a noite e o sol que tarda a amanhecer nos presenteando com as noites mais claras que pudemos experimentar, desejosos de que outras tantas possam vir para contemplarmos os eclipses que criamos entre nossos desejos nos céus de nossas bocas.
Não tarde a ser a luz incandescente de meu crepúsculo, minha estrela da tarde, porque eu ainda espero que seu luar me nasça e me amanheça, rompendo a ordem dos luzeiros celestes e a lógica dos tempos marcadamente cansativos.
Chegue em uma tarde e faça com que meu corpo lhe guarde e me esqueça, antes que seja tarde, e eu mesma me converta no próprio esquecimento, no limbo entre a incerteza do que é alegria, do que é a tristeza, do sei ou pensava saber.

Que seja a tarde o momento em que cheguemos nos festejos das festas de fogo e preces que abrem as portas dos sonhos, que abrem os braços do infinito para as tantas histórias, que abrem os vinhos das calmarias que nunca chegam tarde.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Metades



Para o céu exausto de preces,
Tempestades.
Para copos cheio de amargor, 
Gotas d'água.
Para paisagens muito tranquilas,
Furacões.
Para mares em calmaria,
Maremotos.
Para pensamentos avulsos,
Turbilhão.
Para tudo aquilo que não nos cabe,
Desabafos.
Para o que sufoca,
Liberdades.
Para mãos espalmadas, 
Cuidado.
Para dias nublados,
Giz.
Para músicas tristes,
noites longas.
Para flores coloridas,
Moldura de janelas .
Para os meios que não bastam,
Busca pelo completo.
Para todo aquele que é mais,
Transbordamentos.
Porque as metades são partes
Que precisam de seus complementos.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Ausência



Chegou-me aos braços a sua ausência.
Invadiu-me a cama,
A noite, o porta retrato.
Era uma falta dolorida, de estar doente.
Era uma vontade de ficar encolhida,
Recolhida, remoída.
Era uma falta arrepiante,
Lâmina afiada, cortante,
Poema sem métrica, irritante,
Espaços sem preencher.
Chegou-me aquela ausência como fantasma,
Vulto negro sem contraste com a madrugada,
Sombra presente de tudo o que já tinha ido.

Passado presente como se fosse possível.

sábado, 11 de abril de 2015

Vãos



É que no fim das contas
Tudo é vão a se preencher:
O espaço entre nossas mãos,
A falta dos abraços,
Os silêncios praticados,
Os amores não declarados.
Sejamos o cimento tão esperado:
Histórias que se cruzam,
Dedos entrelaçados.
É clichê e realista:
Todos nós esperamos
Alguém que nos faça

Ver a vida de maneira simplista!

sexta-feira, 10 de abril de 2015

In Memoriam





O que não se apaga
É o amor da memória.
É o que vi de olhos fechados,
É aquilo que desnorteou
Quando cheguei ao norte.
O que não esqueço
É o que me tirou o ar.
O segundo em que parei de respirar
A surpresa embrulhada em dia claro,
A serra dourada de sol
Em dia comum, sem feriado,
Em fuga do mundo,
Que de tanto só andar
A mim parecia estagnado.
O que ainda lembro
É o cheiro do café fresco,
O canto longínquo no tempo,
Ecoando na sala de visita.
É o véu que nunca usei,
E a dança que ensaiei.
O que me corre nas veias,
Passa pelos olhos e pelo peito,
Não é sangue, mas tem tons de vermelho:
É sonho de infância, terracota, barro,
Doce de padaria.
É o reflexo crescendo e mudando no espelho,
É papel, cola, tesoura,
Caderno novo, caneta colorida.
É passeio e vestido de estampa florida.
É o que não toco com a ponta dos dedos,

Mas me toca de leve, acaricia.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Eclipse





Toda força é assustadora.
Mas nem toda força é destrutiva.
Há, em toda força, um ponto de fraqueza,
Há, em toda fortaleza, um quê de fragilidade.
Se o eclipse se mostra como uma força,
Que seus olhos saibam se acostumar.
Se, por outro lado sol e lua se encontram,
É porque o tempo certo sabem esperar.
O divino encontro não acontece todo dia
É preciso paciência para vê-lo chegar,
É preciso atenção para não deixá-lo passar.
Somos eclipses: escondemo-nos
Quando na verdade, precisamos nos mostrar.
Sejamos um eclipse desfeitos dos véus:

Deixemos a vida nos aproximar!

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Às Avessas



Talvez viver
Seja mesmo morrer às avessas.
E, às avessas,
Descobrimos a bre-VIDA-de de quem somos,
Que ser visceral é necessário,
Mas que nem todo mundo consegue.
Então, que aprendamos a lidar com nossos limites.
É quando nos conhecemos que chegamos mais longe:
E ir cada vez mais longe,
Dentro de nós é que vale a pena.


(E dessa pena, faço poema!)